No centro da polêmica sobre a concessão dos serviços de água e esgoto em Marabá, o prefeito João Salame (Pros) se revela tranquilo.

Salame refuta as acusações de que estaria querendo privatizar a água e o esgoto, garantindo que a ideia é assegurar esses serviços para a toda população a preços acessíveis.

Veja a seguir entrevista concedida ao blog pelo prefeito de Marabá, na noite de segunda-feira, 10.

 

Blog – É verdade que o senhor está privatizando os serviços de água e esgoto em Marabá?

João Salame – Não é verdade. Primeiro disseram que estou privatizando a Cosanpa. Uma estupidez, porque a Cosanpa é uma empresa do Estado e não posso vendê-la. Sobre os serviços é bom ressaltar que a Cosanpa está em Marabá há 38 anos. Nesse período a empresa não colocou um palmo de água e esgoto na zona rural e no complexo São Félix e Morada Nova. Nos núcleos Marabá Pioneira, Cidade Nova e Nova Marabá colocou apenas 42% de água e quase nada de esgoto. E água de péssima qualidade. Mesmo com os serviços que a Cosanpa está executando agora com recursos do Governo Federal o atendimento ainda vai estar muito distante do desejável. O que querem o Sindicato dos Urbanitários e a Cosanpa? Que a gente renove o contrato por mais 30 anos, de forma acrítica, sem nenhum compromisso da empresa com prazos e metas para universalizar o atendimento de água e esgoto na cidade. Eu quero fazer licitação, para que a própria Cosanpa e outras empresas assumam compromisso que estarão estipulados no edital com relação ao preço da tarifa, a política de investimentos e a prazos e metas. Por último, diferentemente de outros processos, tudo o que a concessionária investir, após o término do contrato, será propriedade do município. Isso está longe de uma visão clássica de privatização. O município sairá ganhando.

Blog – Esse investimento seria de quanto?

João Salame – O investimento foi definido nas audiências públicas. Foram realizadas sete ao todo. Na zona rural e urbana. A sociedade decidiu. Essa audiência que está faltando é a última pra fechar o processo.  O Plano Municipal de Saneamento que foi elaborado prevê investimentos da ordem de R$ 1,2 bilhão para universalizar a água e o esgoto até 2030. Na licitação a empresa que apresentar a melhor proposta para garantir a universalização vai ganhar. A Cosanpa pode participar. Nós não estamos impedindo.

Blog – Uma das críticas feitas a esse processo é que, em caso de uma empresa privada ganhar a licitação, o preço da tarifa de água subiria muito. O que tem de verdade nisso?

João Salame – Hoje a tarifa básica cobrada pela Cosanpa em Marabá gira em torno de R$ 34. Não é verdade que isso vai subir. Ao contrário, a tendência é baixar. Em Xinguara, por exemplo, onde o serviço foi terceirizado e melhorou muito, a tarifa social, para quem menos pode pagar, é de R$ 16. Em Redenção varia de R$ 18 a R$ 20. Agora, é evidente que quem consome mais vai pagar mais. Quem usa a água para ganhar dinheiro, como empresas e indústrias, vai pagar por isso. Enquanto isso a população mais carente vai pagar menos. Essa é a lógica que vamos colocar no edital de licitação. Uma das exigências é a criação da tarifa social.

Blog – Os críticos dessa licitação dizem que pode ocorrer com a água a mesma coisa que ocorreu com a Celpa, pois o preço da energia subiu muito depois que ela foi privatizada. Qual o seu entendimento sobre essa questão?

João Salame – O preço da energia subiu em função de uma política nacional. Quem define os preços é uma agência reguladora nacional, a Aneel. Se ela não quiser e não concordar não tem reajuste. É uma Agência ligada ao governo federal. Por outro lado pagamos no Pará a maior taxa de imposto estadual do País, o ICMS, que é de 25%. Ou seja, ¼ da conta é imposto que vai pros cofres do governo do estado.

Se a diretoria da Cosanpa critica o preço da tarifa de energia elétrica deveria convencer o governador a reduzir o altíssimo imposto que é pago pela população nas contas de luz.

Hoje, na prática a água está privatizada em Marabá. Atende uma minoria apenas, com tarifa alta e qualidade ruim. Eu quero que a partir da licitação tenhamos água para todos e com tarifa social.

Blog – Como o senhor analisa o fato de vários movimentos sociais estarem contra esse processo, o bispo de Marabá ter se posicionado contra e algumas outras personalidades?

João Salame – É natural. Tudo que é novo assusta. Mas tem muito de desinformação e corporativismo. Conversei com o bispo, por exemplo, e ele compreendeu plenamente meus argumentos e me garantiu que reviu sua posição.

Hoje o sistema é perverso com quem mais precisa. O pobre paga a mesma tarifa que o rico. Sem falar que na zona rural, em São Félix e Morada Nova, no bairro Araguaia, no bairro da Coca Cola, no Bairro da Paz, no São Miguel da Conquista e vários outros bairros populares não existe a mínima previsão por parte da Cosanpa de quando a água chegará por lá.

Ou seja, um serviço que não é democrático e muito menos popular.

Blog – Mas se uma empresa privada ganhar a licitação esse serviço pode ser democrático e popular?

João Salame – O povo mais carente não vive de ideologia. Pra essa massa enorme da sociedade ideologia não enche barriga. Deng Xiao Ping, o grande líder que conduziu a China a ser uma grande potência, dizia que não importa a cor do gato, mas se ele caça os ratos. É assim que a maioria do povo pensa. O povo quer água e esgoto. Não importa se o serviço vai ser administrado por uma empresa pública ou privada.

O nosso papel, do poder público, é garantir que o serviço chegue a todas as moradias e a parcela menos favorecida da sociedade não seja prejudicada com uma tarifa alta. Aliás, em várias cidades do País temos exemplo de sistemas onde o serviço é administrado por um concessionário particular, as tarifas são razoáveis e o serviço tem amplo apoio da população.

Quero deixar claro que não tenho nenhuma obsessão por terceirização. No caso da merenda escolar, por exemplo, fui contra a terceirização e a prefeitura assumiu o serviço. No caso da coleta do lixo estou preparando a administração para trazer de volta o serviço que hoje é terceirizado. São duas áreas onde a promiscuidade entre o público e o privado tem produzido grandes escândalos.

Mas no caso da água e do esgoto a prefeitura não tem capacidade de investimento para universalizar o serviço.

E ao longo desses 38 anos a Cosanpa também demonstrou não ter. Espero que na licitação, com o apoio do Governo do Estado, a Cosanpa mude de postura, participe e se comprometa com os investimentos que Marabá precisa. Eu não vou ceder aos interesses dela em detrimento dos interesses da maioria da sociedade de Marabá que quer água e esgoto de qualidade, que quer compromissos.

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Atualização às 08:34 

Depois que a entrevista com o prefeito de Marabá havia sido concluída, e editada -,  lembrei de uma pergunta que não fizera a ele, questionando seu passado de lutas junto às esquerdas do país.

Agora pela manhã, João Salame foi acionado pelo telefone, atendendo ao pedido de responder ao questionamento,  a seguir publicada:

Blog – No inicio dos anos 80 o senhor combateu a ditadura, foi líder estudantil e militante do Partido Comunista Brasileiro. Depois foi líder sindical e um dos membros da Executiva Nacional da CUT. Militou em partidos clandestinos e por um bom período esteve filiado ao PPS. Ou seja, sempre teve uma militância de esquerda. As teses que o senhor esta defendendo hoje nessa questão da água e do esgoto não são contraditórias com essa trajetória de militante de esquerda?

 João Salame – De forma alguma. Uma parte da esquerda deturpou o sentido da luta socialista. E em nome desse dogmatismo cometeu crimes bárbaros ao longo da historia. Uma das dificuldades da esquerda era justamente como se relacionar com a iniciativa privada. Na Rússia de Stalin,  e na China de Mao Tse Tung,  o enfrentamento com as empresas privadas e proprietários do campo redundou no assassinato de milhões de pessoas. E de que adiantou toda essa violência?

Hoje na China e na Rússia, os capitalistas ditam as economias e a política submetendo as populações a uma exploração vil. Esse tipo de esquerda esta representada hoje em posições como da diretoria do Sindicato dos Urbanitários.

Eles esconjuram qualquer tipo de relação com a iniciativa privada, mesmo que isso signifique impedir que a esmagadora maioria da população tenha acesso a serviços tão básicos como o de água e esgoto.

Não querem sequer debater. Nas audiências publicas só eles querem falar, berram, partem para a agressão verbal. Ou seja, para a violência. Não querem deixar nem os representantes das associações de moradores falar.

Esse tipo de esquerda faliu.

Não e a toa que quando eles lançam seus candidatos em Marabá e no Brasil ficam nos últimos lugares. A maioria da sociedade condenas essas posturas.  Veja os votos que os candidatos desse sindicato tiveram nas eleições para prefeito, vereador e deputado nas ultimas eleições em Marabá e no Pará. Uma vergonha. Mas se recusam a fazer uma reflexão. Partem para a violência e os ataques pessoais. Esse é o método que matou milhões na China e na Rússia em nome de um suposto socialismo.

Desse tipo de esquerda eu me afastei há um bom tempo.

Pertenço a uma esquerda democrática, que tem como referencia principal a melhoria da qualidade de vida da maioria da sociedade. Que não tem preconceitos em relação a empresas estatais e privadas. Vivemos numa sociedade capitalista,  temos que conviver com as empresas privadas e, na medida de nossa forca política, que tem que ser respaldada pela sociedade, submetê-las ao controle social. É assim que vamos avançar.