Depois do carnaval, nada melhor do que se internar no “SPA Nelson Cavaquinho”, como sugere o maravilhoso  Luiz Antonio Simas  -, cada dia chegando à perfeição com  seus lindos textos.

 

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SPA  Nelson Cavaquinho

 

     – Luiz Antonio Simas

 

 

Ando tremendamente preocupado com alguns camaradas, vagabundos de escol em antanhos, que estão adoecendo por uma razão prosaica: querem, de qualquer maneira, gozar de ótima saúde e  adoecem por causa disso. Caminham dez quilômetros todas as madrugadas, frequentam academias com acompanhamento do personal trainer, cortaram completamente a gordura do cardápio e, em termos de cana, se limitam a tomar um discreto vinhozinho no jantar. Pior: andam, inclusive, cheirando rolhas para identificar a personalidade da bebida.

 

Por identificar este fenômeno preocupante, e com insuspeito tino comercial, é que tive a ideia de criar um spa. Preciso, apenas, de investidores que apostem no negócio (este texto é uma tentativa de atraí-los). O nome já está escolhido: Centro de Harmonização da Vida Spa Nelson Cavaquinho. A proposta é simples: no Spa Nelson Cavaquinho o sujeito vai exclusivamente para passar quinze dias destruindo a saúde e recuperando a sanidade e o humor.

 

A comida, servida em quantidades industriais por uma cozinha vinte e quatro horas, será baseada apenas em pratos com alto potencial de gordura, sem qualquer alimento orgânico: língua, rabada, dobradinha, feijoada completa, buchada, baião de dois, torresmo, moela e quejandos. A oferta de bebidas – liberadas o tempo inteiro – contemplará conhaques vagabundos, chá de urubu para arrematar o chope, cachaças produzidas no alambique do próprio estabelecimento e toda a sorte de destilados e fermentados que o ser humano criou nos últimos oito mil anos.

 

Esportes, apenas três: porrinha, ronda e sinuca. Quem for flagrado caminhando, meditando ou curtindo a natureza será, imediatamente, encaminhado ao serviço de acompanhamento psicológico para tomar porrada. A trilha sonora, evidentemente, homenageará Nelson Cavaquinho e outros do mesmo quilate. Prometo que durante a estadia no spa o sujeito não correrá o risco de ouvir nada que lembre as trilhas sonoras de academias.

 

Não haverá, por óbvio, qualquer aparelho de ginástica por perto. As salas de academias, repletas de machões, gays marombados e mulheres saradas penduradas em ferros e gritando (lembram muito, as salas de musculação, as antigas salas de tortura do Santo Ofício da Inquisição), serão substituídas por ambientes baseados em bares e botequins de responsabilidade e insuspeita reputação.

 

Todo spa oferece palestras motivacionais para levantar a estima do cliente. O Nelson Cavaquinho fará o inverso. Teremos especialistas em destruir a estima de qualquer um, mostrar que as coisas, em geral, não costumam dar certo, que as relações amorosas terminam, o tesão acaba e a felicidade é um brinquedo que não tem. Bombardeado com a obrigação de sorrir e achar que tudo é ótimo o ano inteiro, o frequentador do nosso spa passará quinze dias melhorando como ser humano – que é o que em geral acontece quando descobrimos que não somos merda nenhuma e o nosso destino é o bom e velho buraco.

 

O lema do estabelecimento está escolhido: Mens sana in corpore insano. Depois de uma revigorante estadia no spa, o cidadão pode voltar ao cotidiano de privações mais revigorado, apto a enfrentar todo o estresse gerado pela busca do corpo perfeito, da felicidade, do sucesso profissional e financeiro, e da fonte da eterna juventude. Tudo isso, enfim, que nos fará morrer gozando de perfeita saúde física e  vasto repertório de neuroses.

 

Saravá!