Unindo os contrários.
(*) – Evilângela Lima
Existem palavras que grudam na gente, que nos fazem pensar e repensar, definir e redefinir conceitos. Andrógino, palavra estranha na pronúncia e no significado, grudou em mim.
E fui tratando de transmiti-la às pessoas que me cercam diariamente, enquanto tentava transpô-la para minhas experiências de mãe, professora, amiga e mulher.
Grudou em todo mundo.
Tentarei conceitua-la do meu jeito, em três cenas, ou atos, para que seja melhor compreendida.
1ª Cena:
Durante a ministração de uma aula para turma de Ensino Médio, a professora repassa no quadro branco exercícios sobre o assunto estudado, enquanto um grupo de três alunos, todos homens, travam o seguinte diálogo:
– Vamos combinar: amanhã a gente vai lá no cursinho de manhã fazer a inscrição para o simulado.
Outro aluno, o mais sisudo do grupo, rebateu:
– Não dá. De manhã tenho que arrumar a casa e fazer o almoço.
Nesse momento a sala toda silenciou, ouviam discretamente a conversa, a professora, mesmo prosseguindo com a escrita, ficou mais atenta.
– Qual é cara, todo mundo na tua casa tá grande. Precisam fazer como faço lá em casa: arrumo um dia sim e outro não, é só manter as coisas organizadas.
O outro colega, que até o momento ficara calado, completou:
– Lá em casa fazemos a faxina no final de semana, já que todo mundo trabalha a semana toda. Minha mãe lava a roupa e eu com minha irmã cuidamos da casa. Durante a semana só mantemos a limpeza.
Em seguida uma serie de sugestões de limpeza foram sendo proferidas pelos dois doutores no assunto ao colega que se enrolava com a limpeza da casa.
A professora virou-se para fitar melhor os meninos donos de casa, percebeu que as meninas estavam olhando-os com admiração. Não se segurou e exclamou:
– Gente, que lindo! Homens com conversa de mulheres. Meninas, casem com esses meninos: eles serão excelentes maridos.
A turma toda sorriu.
2º cena;
Platão (429 a.C. – 347 a.C.) no livro “ O Banquete”, afirma que no princípio havia três espécies de homens: Andros ( personifica a masculinidade), Gynos (a parte feminina) e Androgynos ( ser que unia a masculinidade e a feminilidade). Os Androgynos eram poderosos justamente por conseguirem reunir os contrários. Resolveram travar uma guerra contra os deuses do Olimpo, e Zeus os castigou separando-os, colocando-os em corpos diferentes.
Platonicamente cada ser humano é apenas metade, necessitando encontrar seu fragmento para existir por completo.
3º cena:
Observando um grupo de adolescentes discutindo, percebi que um chamou o outro de “andrógino”. Fiquei curiosa, seria um novo palavrão? Perguntei a eles o que essa palavra significava, obtive a seguinte resposta:
– Ora andrógino é andrógino. A gente escuta isso em um seriado que passa na televisão.
– Mas vocês não sabem o que é? Como chamam o outro do que não sabem? Será que é ser robô?
Sorriram de mim, percebi que não queriam falar como entendiam o significado da palavra. Continuei instigando, como professora gosto de estar atenta às palavras que os alunos internalizam, pois demonstram possíveis tendências, que tanto podem ser positivas como negativas.
Enfim, um mais atirado resolveu me falar:
– Andrógino é gay.
Muitas interrogações surgiram na minha cabeça. Sai da conversa direto para o Google, ele resolve quase todos os meus problemas.
Foi assim que cheguei até a uma heroína contemporânea, Lisbeth Salander, personagem da trilogia Millennium ( os livros: O homem que não amava as mulheres, A menina que brincava com fogo e A rainha do castelo de ar), do jornalista sueco Stieg Larsson.
A melhor descrição que encontrei da personagem foi em um artigo de Eliane Brum à Revista Época: “Nossa heroína não acredita em (quase) nada. Nem em (quase) ninguém. Ela não tem ilusões: Lisbeth sabe que está sozinha.(…) Com uma profunda e justificada desconfiança dos homens – a começar pelo próprio pai – e com uma profunda pena das mulheres – a começar pela própria mãe –, Lisbeth Salander cria um homem e uma mulher, um nem homem nem mulher para si. Radical em sua androginia, Lisbeth poderia ser definida como uma bissexual, não fosse esta uma definição superada e que já não dá mais conta da complexidade da sexualidade humana. Lisbeth, também sexualmente, só pode ser definida pela indefinição. Como o mundo que prefere habitar, o da internet, nossa heroína é fluida e sem fronteiras.”
Através desta personagem consegui conceituar, do meu jeito, a palavra que tem ganhado espaço nas conversas dos adolescentes. Andrógino não é ser gay ou lésbica, é conseguir reunir os contrários dentro de si, é reunir os fragmentos homem/mulher de cada um. Um conceito mitológico que encontrou aceitação na vida contemporânea.
Conceito que não se situa apenas na sexualidade do individuo. Corro o risco de afirmar que ser andrógino é ser homem e mulher ao mesmo tempo sem perder sua sexualidade, continuaremos sendo homem ou mulher.
Preocupo-me quando nossos adolescentes e jovens utilizam palavras em sentido pejorativo, deixando de desfrutar da beleza do seu verdadeiro significado.
Atualmente, criamos nossos filhos homens com mais feminilidade. Logo cedo acostumam-se aos afazeres domésticos e não perdem sua masculinidade por isso, ao contrário, tornam-se homens mais completos, mais companheiros de suas mulheres, quer sejam mães, irmãs, namoradas, esposas.
Nossas meninas são mais descoladas, praticam esportes masculinos, algumas, até, seguem profissões antes exclusiva dos homens, sem perderem sua sensualidade feminina.
Somos seres andróginos tentando conciliar os contrários. Nossa complexidade humana não cabe em definições pré-concebidas.
Enquanto educadores, devemos expandir nossos olhos para além dos comportamentos ditados pelo modismo da mídia, construindo com nossos alunos ou filhos conceitos inovadores, que os auxiliarão a se encontrarem enquanto homem/mulher, andróginos.
(*) Evilângela Lima, Educadora, Diretora da Escola de Ensino Fundamental São José.
Evilangela
9 de março de 2012 - 20:17Joab;
Sou muito feliz sendo sua amiga. Obrigada por sempre sorrir comigo das coisas da vida.
Anny, minha linda cantora, não queria que saísse da escola, mas você está crescendo e faz parte desse crescimento conhecer novos lugares, novas pessoas.
Mas volte sempre para o seu lar. Venha nos presentear com o som da sua voz, que acalma a minha alma.
Obrigada.
Beijão.
Johnny
9 de março de 2012 - 11:14Apos a leitura eu percebi que todos nós temos um pouco de cada, pois um homem tambem tem q ser sencivel e a ao mesmo tempo primitivo, essa dualidade nos completa…
Anny ex aluna
9 de março de 2012 - 11:00Evilangela, recebi a recomendação de ler o texto e fiquei maravilhada.
Parabens que Deus te ilumine sempre e que muitos e muitos textos possam vir.
Ah eu não quero sair da escola são jósé não …
Mauro Brandão
9 de março de 2012 - 10:57ola, Evilangela o texto esta surpreendente muito bom mesmo, Parabens e felicidades.
Gustavo Sales
9 de março de 2012 - 10:56Ao ler esse texto fiquei imaginando como seria estar nesta batalha, sendo assim creio que os seus textos nos fazem viajar e ir além da leitura.
Parabens Evilangela você é muito boa.
Edmilson
9 de março de 2012 - 10:53Passando para parabenizar pelo texto que sempre nos surpreende.
grande abraço e espero mas …
Creio que tudo que sai da cabeça da mulher é show de bola…
Rita de Cassia
9 de março de 2012 - 10:50Parabens Evilangela, Você simplismente é SURPREENDENTE, esses seus textos me fazem viajar.
Por exemplo: Andróginos……………….
andreza
9 de março de 2012 - 10:48Passando aqui para parabenizar o blog e a essa Educadora que nos presentiu com esse texto maravilhoso.
Parabens esperando outros.
Joab Baião
9 de março de 2012 - 10:45Fico penssando o quanto sinto orgulho de ser seu amigo e colaborador para seu crescimento, tenho certeza que seus textos sempre irão nos levar a pensar e refletir sobre tudo que esta a nossa volta.
Esse texto é uma obra prima, vpcê é uma mulher muito talentosa e sei que muita gente ainda prescisa ler e ver o quanto podemos aprender com ele e com todos os outros que você ja criou e ainda à de criar.
Parabéns que Deus te abençoe sempre.
E a você hiroshi Parabéns pelo blog muito bom e com um conteúdo de grande aproveitamento e aprendizado.
Abigail
9 de março de 2012 - 10:40…”Podemos observar que tudo que nos liga ao passado nos faz refletir realmente quem somos e de onde viemos”…
Este texto é uma obra muito bonita e de grande porte.
Parabens Evilangela por nos contemplar com um lindo texto, e a você hiroshi, que abra as portas cada vez mais para esses talentos de nossa terra.
Wal
8 de março de 2012 - 17:52Legal esse texto, bom saber que somos an-dró-gi-nos, agora fiquie mais tranquila, não entendia por que as vezes meu lado masculino estava mais aflorado……. brincadeira……. agora falando sério, seus alunos devem ter se admirados por você não conhecer essa palavra, e mais uma vez tirou de letra, se entrosou com a galera, perguntou, depois não se conteve pesquisou, e por último foi a própia Evi que conheço, não guardou pra si o novo conhecimento, transmitiu a todos. Parabéns