Vou tocar o texto na primeira pessoa.

Estúpida, desgraçadamente estúpida, a morte do cantor Marcelo Mohry, cujo corpo será sepultado logo mais no cemitério da Nova Marabá.

Ele morreu atropelado na Transmangueira, via que liga os núcleos Nova e Velha Marabá seguindo a extensão do rio Tocantins, quando fazia o que sempre gostava de praticar, em seus momentos de folga: passear de bicicleta.

A morte de Marcelo está causando estrago grande aqui dentro do meu coração. .

Garotão de 40 anos, sempre risonho e brincalhão, Mohry era um dos cantores mais requisitados da cidade, marcando seu talento em bares e encontros sociais, além de vez por outra participar de shows.

Estávamos projetando iniciar ensaios na garagem de minha casa para a parceria de um trabalho musical que incluiria músicas minhas e dele.

Chegamos a manter o primeiro encontro de “aquecimento” em outubro, antes do Círio de Belém. Ficamos uma tarde inteira de sábado tocando juntos – pela primeira vez.

O trato era de que retomaríamos o compartilhamento de nossas criações no início de novembro. Não deu.

Excesso de trabalho na produtora adiou o segundo encontro.

Na última terça-feira, 29, coincidentemente, dia de meu aniversário, eu e Marcelo nos encontramos casualmente em frente ao Bradesco da Nova Marabá.

Ele me cobrou o início dos ensaios, me justifiquei a falta, e ficou acertado de que o projeto, para ser colocado em ignição, não passaria de janeiro.

Marcelo estava pra cima (aliás, nunca o vi pra baixo, a alegria o contagiava).

Ali mesmo, entre burburinhos do movimento ao sol do meio dia, em pleno centro comercial da Nova Marabá, para minha surpresa, rapidamente ele cantou algo que já estava construindo em seu violão em cima dos versos de um composição minha (Blues de ardências)

 

Assim  um blues
para me precaver
da ardência da alma,

Me vestir
dessas súplicas,

E ver a tempestade
varrer o que me arde…

 

– Cara, isso é lindo demais. Estou com os versos na cabeça e a canção tá saindo…

Foi a última expressão que ouvi de Marcelo.

Trechos da composição de minha autoria que ele já estava trabalhando,

Em verdade, essa seria a primeira experiência musical minha ao lado de um parceiro.

Componho solitariamente, canções para uso pessoal, sem compartilhar com ninguém.

Marcelo escreveu as primeiras linhas de uma parceria que nunca existirá.

Com a definitiva ausência dele, agora, os versos  do blues morrem também num ponto final dramático:

Me vestir
dessas súplicas,
E ver a tempestade
varrer o que me arde…

 

Externo minha incontida dor a Pedrina Mohry, mãe babona do Marcelo, e uma das mais antigas escrivãs de Polícia Civil de Marabá.

Descanse em paz, garoto, cantando blues na banda celestial que formarás-,  onde estejas.