– “Já são uma hora, e ele não chegou ainda?!

 

Se irmã Zoé  ainda  estivesse lecionando Português, a frase acima receberia alguma correção por suposto erro de concordância?

Certamente, numa hipotética sala de aula, a querida mestra nos diria que o fato de alguém  estar atrasado não justifica o erro de concordância.

O verbo ser, lembraria a saudosa irmã dominicana, quando indicar horas concordará com o numeral a que se refere. Claro está, então, que ficará no singular, ao indicar “uma hora”, “meio-dia”, meia-noite” ou “zero hora” e no plural nas demais horas do dia.

Com sua voz suave, repetiria o que ensinou a milhares de jovens, inclusive a mim.

 

  – “Por exemplo, deveremos dizer “Já são 19h, mas o professor ainda não enviou o texto”;  e “Era meio-dia, quando José chegou”.

E completaria que essa regra também serve para o verbo ser, quando indicar distância:

 

–  “É um quilômetro daqui até a sua casa”; “São mais de quatrocentos quilômetros de Belém a Marabá.”. 

Mais, Zoé não se limitaria a isso.

Falaria, também,  da concordância do verbo ser  na indicação de datas,.

Aqui, agora, o poster fica divagando, tentando abraçar imagens distantes,  para escrever este texto, da calma com que ela procurava encantar a língua portuguesa, explicando,  sem complicação o que ainda não “entrava” direito na cabeça de seus jovens meninos.

 

O  verbo ser tanto poderá ficar no singular, quanto no plural, a não ser no primeiro dia do mês. Neste  caso, o verbo ficará no singular. Por exemplo: “É dezoito de abril” (= É dia dezoito de abril) ou “São dezoito de abril” (= São dezoito dias de abril); “É primeiro de maio” (= É dia primeiro de maio ou é o primeiro dia de maio). 

A frase apresentada na abertura deste texto,  portanto, está errada, nos diria irmã Zoé.

Corrigindo-a, teremos o seguinte:

 

– “Já é uma hora, e ele não chegou ainda?!”

 

Foi mais ou menos assim que ex-alunos de Irmã Zoé, aprendemos a escrever Português.

Só não aprendeu quem não quis.

A freira dominicana marcou sua presença pelas salas de aula do Colégio Santa Terezinha, professora de Português.

Dura, quando o momento exigia, mas extremamente meiga e ciosa de sua importância para a escola religiosa.

Eu, particularmente,  adorava as aulas de Zoé.

Rebelde por natureza, não fui desses alunos comportados em sala de aula, zoava, perturbava, gostava do frenesi.

Quando chegava a hora do horário de Zoé, eu me transformava, havia encantamento ao redor.

Zoé dava aos seus alunos possibilidades de se construir.

Como não frequento mais salas de aula, não sei como funciona as aulas de português -, mas  é lógico que enquanto não houver motivação, não há aprendizagem.

O prazer, o lúdico da educação  deve  perpassar no restante da vida escolar.

A escola de Zoé cumpriu seu papel  , no seu tempo certo.

Seu objetivo era informar, pois o acesso à informação  era privilégio de poucos e a escola,  o único local onde se adquiria essa informação.

Ela fazia decorar, porque não havia onde acessar  fora dela. Desprezar a escola antiga é cuspir  no prato que comemos.

Hoje,  o acesso à informação não é exclusividade da escola.

Atualmente,  além da informação, é preciso trabalhar uma série de competências e habilidades, conhecimento, ética, desenvolvimento corporal, enfim, formação!

Hoje leis permitem  aos alunos  estudarem fora da escola, em casa.

No tempo de Zoé, ela mostrava que a formação necessitava do “outro”.  Limites e valores precisavam ser trabalhados em todos os níveis escolares.

Fico curioso para saber se minha saudosa professora chegou a se surpreender com o internetês,  linguagem caracterizada pela agilidade e facilidade de escrita, e, por isso,  composta quase que inteiramente por abreviações – ou, podemos até dizer,  por códigos.

 

Curioso, também,  em imaginar como seria irmã Zoé, hoje, numa sala de aula, cercada de laptops e da linguagem  alt+tab, multitarefada..

Ela  seria feliz convivendo com o uso do internetês e o exagero do gerúndio no dia-a-dia do alunado?

E diante de uma frase desse tipo, como reagiria ?

  – Pq vc naum xego na hr q eu t flei?

 

O que ela achava do surgimento da nova linguagem dos comunicadores instantâneos (chats online, blogs, MSN, SMS, ICQ), me pergunto.

Mas, como Zoé era professora que nos ensinava a ser curiosos, vez que ela demonstrava,  também,  esse interesse pelo que suscitava conhecimento e aprendizado, quem sabe ela tenha se adaptado com facilidade aos “novos tempos”, convivendo pacificamente com  o advento da Internet?

Pois bem,  tudo isso para dizer que irmã Zoé não está mais entre nós.

No sábado, dia 16 de março, a amada mestra faleceu às 9 horas da manhã, em Goiânia.

Zoé completaria 95 anos agora, dia 7 de abril – dois dias após o centenário de Marabá.

Morreu cercada pelo carinho de suas irmãs dominicanas, com quem viveu pregando a paz, o evangelho e a Educação, no Externato São José, na capital goiana.

Durante funeral, Zoé recebeu homenagens de ex-alunos do Colégio Santa Terezinha, entre eles, Maria do Carmo Castro e de Sebastião Rui, e das irmãs dominicanas.

Emocionante homenagem lhe foi prestada por Irmã Dijé, atual coordenadora da Província Nossa Senhora de Guadalupe, marabaense que conheceu Zoé ainda estudante, aos 14 anos,  e com quem passou a conviver, recebendo ensinamentos religiosos e orientação educacional.

O prefeito de Marabá, João Salame, ex-aluno da querida freira dominicana, comunicou esta manhã ao pôster da decisão de prestar  homenagem a Zoé – provavelmente denominando uma grande escola que irá construir com o nome da irmã que tantas gerações ajudou a formar no município.