Excelente o nível da entrevista que a jornalista e blogueira Ana Célia Pinheiro fez com o secretário da Casa Civil, Cláudio Puty. O papo dos dois ocorreu na noite de terça-feira, sem pauta antecipada.

Ana Célia mandou ver, ao seu estilo segura-que-é-tua.

Puty rebateu todas as perguntas, revelando, pela primeira vez ao público de forma ampla e potencialmente provocado pela blogueira, seu pensamento político de esquerda (ainda pouco conhecido), comprometido com um projeto de desenvolvimento do Estado cuja idéia central prioriza a revolução nas prioridades.

Na longa entrevista, Cláudio Puty aceita, bem-humorado, as provocações de Ana, provocando-a, também.

Numa das respostas, quando emite juízo de valor sobre a atuação dos tucanos à frente de três governos, o Chefe da Casa Civil se esbalda em comparar a inversão de prioridades, deixando claro que o desenvolvimento humano da população paraense passa pela distribuição real de benefícios com vistas a acabar com o apartheid social. E aí é que ele, em nome do Governo Ana Júlia, considera ser mais importante o cidadão ter um lugar para morar sem correr o risco dela ser expulso, e que este lugar seja limpo, com saneamento, água potável e coleta de lixo.

Coisas simples, mas, ainda, muito distantes do alcance das famílias isoladas em seus guetos.

O blogger selecionou trechos da longa entrevista:

1-Considerações sobre a DS:

Foi muito importante ao trazer para o Brasil o debate sobre cotas para mulheres – tem um compromisso muito grande com o feminismo militante. Teve um debate no PT também muito grande, uma contribuição da DS, para o reconhecimento do direito à tendência no interior do PT. Todas as organizações socialistas anteriores ao PT e que entram no PT, a DS preconizou e preconiza a necessidade do direito à tendência no PT, uma ruptura com a tradição dos partidos comunistas, a tradição do Comitê Central e da unicidade de opiniões. Teve um papel importante, também, na prefeitura de Porto Alegre, ao levar adiante a idéia do orçamento participativo, que, em grande medida, foi uma elaboração também inspirada por militantes da DS; a idéia de empreendermos políticas municipalistas radicais, de democracia direta. Então, é uma corrente política como outra do PT, que tem na transformação socialista uma meta, o socialismo democrático uma meta importante, um sonho, e que preconiza que o PT deva estabelecer relações com grupos, com a esquerda democrática da América Latina e do mundo. Nós achamos que a transformação tem que ser inspirada, também, na experiência de outros países: da esquer
da européia, da esquerda latino-americana, a experiência cubana. Enfim, é um conjunto de idéias…

2- Kátia Abreu, no Pará, pedindo intervenção no governo Ana Júlia:

Para tentar evitar uma transformação real e necessária no campo brasileiro, nas políticas públicas brasileiras, você cria um demônio inexistente, para poder agregar ao seu redor, ao redor das suas posições injustificáveis, se forem discutidas à luz de uma certa racionalidade, um bando de gente amedrontada. Então, o que ela veio fazer aqui foi, na realidade, fazer agitação política, fazer oposição à governadora, porque os interesses que ela representa estão, estavam e serão contrariados enquanto estivermos no governo…

3- Discordando de que o governo não tenha nenhuma obra apresentada à população:

Ainda é muito cedo para julgar o governo, porque o governo não acabou, muita coisa vai começar a ser inaugurada agora. Há pouco entregamos algumas casas, já na primeira obra do PAC, no Fé em Deus, aqui na Augusto Montenegro – e é impressionante você ver como era e como está ficando. A mesma coisa você vai ver se for ao Tucunduba. Então, muita coisa vai ocorrer – e a percepção pública de um governo muda muito a partir do momento em que as obras vão maturando. Então, nada mais falso do que dizer que é um governo sem obras. É um governo, obviamente, com obras distintas: vamos fazer cinco vezes mais habitação popular do que o governo Jatene. Em termos de ligações de água, a Cosanpa administrou, até o início deste governo, 400 mil e nós vamos fazer, só neste governo, 200 mil ligações – é a nossa meta, com o PAC, com outras ações de saneamento. Tudo isso é obra. Obviamente, não teve Mangal das Garças, nem Estação das Docas, nem outras obras desse tipo, de caráter mais pontual. Já fizemos cerca de 400 reformas e reconstruções de escolas. Temos uma quantidade enorme de obras no interior.

(…) Eu fico muito preocupado em como é que vai ficar o estado psíquico dessas pessoas quando começarmos a inaugurar as obras do PAC, que estão todas muito adiantadas…
(…) O saneamento lá em Marabá, a ETE do Una. Então, tudo isso é muita coisa, muita obra… A nova Santa Casa, não esqueçamos, estamos aí acompanhando diariamente para que ela saia no prazo; o Ação Metrópole, que você acompanha como está ao passar pela Júlio César, pela Independência; a perna sul da Alça Viária, com a ponte sobre o rio Capim. Enfim: uma quantidade grande de obras que temos para inaugurar. Como eu disse: o governo ainda não acabou.

4- Convivência com o PMDB:

Não acho que seja difícil a convivência. Nós queremos o PMDB aliado, queremos que esteja na chapa de reeleição da Ana Júlia. A posição do PT é a de apoiar um candidato do PMDB para o Senado, aqui no Pará. Essa é uma decisão de diretório – não estou falando como membro do governo, mas, como petista – votada por unanimidade, sem problema algum. Então, isso demonstra que não há dificuldade fundamental na relação com eles. O que tivemos foi um problema de gestão, que tivemos, também, com forças do PT, inclusive da DS. Tivemos diversos problemas, mas, essas coisas são corrigidas. O problema é quando se associam correções na gestão – você tem de trocar uma pessoa aqui, né?, que nós avaliamos que não está dando conta do recado; ou teve problema aqui e acolá e troca aqui e acolá; isso aconteceu com muita gente do PT…

5- Uma análise sobre os governos do PSDB:

O governo do PSDB foi um governo centralizado na capital e um governo que, ao se deparar com a complexidade dos problemas na saúde, na educação, na segurança, resolveu fazer o mais simples, a partir de obras vistosas – o que não se pode dizer que seja uma coisa pouco inteligente; é uma coisa muito inteligente, só que não muda o estado. Então, em vez de enfrentar os problemas da municipalização da saúde, os problemas da saúde básica, preferiram construir hospitais de média e alta complexidade nas regiões – mesmo sabendo que a manutenção desses hospitais, por ano, seria mais cara até que a sua construção – em vez de empreender o processo, que é muito mais difícil, muito mais complicado, de fortalecimento da saúde básica. É isso que nos diferencia. Em todas as áreas você acha esse padrão pragmático/centralizador. Um padrão que funciona muito bem para as eleições, tanto que ganharam duas e disputaram a terceira. Mas, como eu disse, não resolve os problemas do povo. Daí a eleição da Ana Júlia. Eu poderia falar de várias outras características, mas acho que essa é a que simplifica mais.

6- Sobre a fama de ser o todo poderoso secretário controlador do governo:

Eu não sei. Isso quem tem de dizer é quem acusa; o ônus é do acusador. Mas, de qualquer maneira, talvez a atividade de articulação política esteja sempre, em alguma forma, associada à idéia da política enquanto uma arte manipulatória, o que é exatamente o contrário do que se pretende aqui. Tanto do projeto do governo, quanto do projeto de esquerda, enquanto tal, ele tem de ser esclarecedor. Tem de ser emancipatório, por assim dizer. Tem de ser o contrário da política vista simplesmente… Ou enquanto jogos de gabinete, jogos de palácios…

7- As perdas financeiras do Estado do Pará em face da crise econômica:

Esse mês nós perdemos R$ 70 milhões, mas, no passado, não foi tanto, variou. Mas eu creio que as perdas acumuladas chegam a R$ 400 milhões.

8- Sobre a retomada das conversas entre Ana Júlia e Jader Barbalho:

Estamos tentando confirmar… Acho que esta semana deve ter uma conversa da governadora com o deputado Jader.

O bom mesmo é ir até o Perereca da Vizinha, e ler toda a entrevista.