Muitas pessoas conhecem o cofundador da Apple Steve Jobs como um exigente visionário da tecnologia. Poucas o conhecem como um romântico, um poeta ou alguém fantasiado como um personagem de “Alice no País das Maravilhas” em um shopping center na Califórnia.
Estas últimas características ajudam a compor o retrato de Jobs feito por sua primeira namorada séria, Chrisann Brennan, em uma matéria da “Rolling Stone” compartilhada exclusivamente com a Associated Press antes de chegar às bancas.

Brennan e Jobs se conheceram em 1972, quando estudavam na Homestead High School em Cupertino (Califórnia) –ele estava no último ano do colegial, e ela, no penúltimo. No artigo, ela narra suas aventuras com um Jobs de 17 anos no verão daquele ano, da mudança juntos para uma cabana ao episódio em que foram pagos para representar personagens de “Alice” em um shopping center local.

Jobs morreu em 5 de outubro, aos 56 anos, depois de batalhar por anos com câncer de pâncreas. Após tirar sua terceira licença médica da Apple, em janeiro, ele renunciou ao cargo de executivo-chefe em agosto, mas continuou na empresa como presidente do conselho. Sua morte veio um dia depois de a Apple lançar o iPhone mais recente, o 4S, que começa a ser vendido nesta sexta-feira (14).

O relacionamento com idas e vindas de Brennan com Jobs durou até o nascimento da filha do casal, Lisa Brennan-Jobs, em 1978.
Ela diz que os dois decidiram morar juntos naquele primeiro verão. Brennan tentou pegar um quarto em uma cabana em Cupertino para eles, mas foi rejeitada pelo homem que alugava o lugar na época –ele disse que não havia espaço para um casal. De alguma maneira, Steve foi capaz de persuadi-lo a mudar de ideia.

“Isso chamou a minha atenção para algo notável nele”, escreve ela no ensaio para a “Rolling Stone”. “Este cara conseguia fazer as coisas funcionarem. E, pelo jeito dele ao tomar conta da situação, eu sabia que ele também sabia disso.”

Na época, diz Brennan, Jobs “era quase 100% romântico”.

“Ele me dizia que éramos parte de uma associação de poetas e visionários chamada por ele de ‘o grupo campo de trigo’ e que estávamos olhando uma janela juntos, com os outros, vendo o mundo inteiro”, escreve ela. “Não sabia do que ele estava falando, mas, com todo o meu coração, eu queria ver essas visões.”

Brennan também conta como Jobs –que pendurou um cartaz de Bob Dylan sobre a cama deles– ficava acordado até tarde escrevendo poemas em sua máquina de escrever elétrica, muitas vezes reescrevendo músicas de Dylan.

Na época, Brennan não ficou impressionada, vendo os resultados como “um monte de músicas de Bob Dylan com algumas mudanças”.
“Só agora eu vejo o que ele estava tentando fazer. Era um solitário e não falava muito, e acho que usou músicas de Dylan para entender o mundo”, escreve ela.

Ao falar de coisas mais bobinhas, Brennan detalha como ela, Jobs, um colega de quarto chamado Al e Steve Wozniak (que mais tarde fundaria a Apple com Jobs) representaram personagens de “Alice” em um shopping center na cidade vizinha de Santa Clara. Brennan conseguiu o papel de Alice, enquanto Al, Jobs e Wozniak se revezavam interpretando o Chapeleiro Maluco e o Coelho Branco –completos, com cabeças gigantes na altura do joelho que eram incrivelmente quentes por causa do calor do verão e do ar condicionado quebrado do shopping.

Brennan escreve que Al, Wozniak e Jobs “mal conseguiam aguentar dez minutos no traje e por isso corriam até os provadores para trocar as cabeças e beber água a cada dez minutos. Era doloroso e hilário de ver”.

Nem todas as lembranças de Brennan são amigáveis. No ensaio para a “Rolling Stone”, ela refere-se ao “muitas vezes imbecil despótico no qual Steve se transformou enquanto crescia para conhecer o mundo”. Por dois anos, Jobs negou ser o pai de Lisa, a criança que Brennan teve em 1978.

O texto de Brennan sai na “Rolling Stone” com uma reportagem de capa de Jeff Goodell, um ex-funcionário da Apple que tem escrito sobre a empresa nos últimos 17 anos. Em seu artigo, Goodell descreve o conhecimento de Jobs sobre negócios, bem como a “personalidade abrasiva” e a “brutalidade sem remorso” que aqueles que trabalharam intensamente com ele conheceram.

 

Tradução : EMERSON KIMURA