O deputado estadual Tião Miranda (PTB) lidera todas as pesquisas de opinião pública na disputa pela prefeitura de Marabá nas eleições deste ano, a exemplo do que ocorria há 4 anos atrás.

Da mesma forma o prefeito João Salame (PMDB) ocupa uma distância razoável, também a exemplo do que aconteceu nas eleições passadas.

Com a diferença que agora Salame já não é mais a esperança de 2012, apesar de que, se estivesse no cargo, seria um adversário temido, pois é conhecida no mundo político sua capacidade de articulação.

Envolvidos em todas as disputas eleitorais nos últimos 24 anos como coordenadores de campanha ou candidatos, os dois resistem às pressões de seus correligionários para assumir suas candidaturas e muita surpresa ainda pode ocorrer até a próxima sexta-feira, que é a data limite para a realização das convenções partidárias.

Por que isso está acontecendo?

Tião Miranda tem no imaginário de uma parcela da população a fama de ser bom gestor e tocador de obras.

Pelos mais variados motivos está com receio dessa fama sair arranhada nos próximos quatro anos caso assuma a prefeitura.

Quando foi prefeito Tião assumiu o município praticamente sem dívidas. O cenário econômico internacional, nacional e local era favorável, inclusive com dez guseiras em Marabá gerando empregos e impostos.

O governador Almir Gabriel era um parceiro de sua gestão, a exemplo do presidente Fernando Henrique, o que possibilitou a liberação de recursos para a construção da Orla do Rio Tocantins, sua obra mais vistosa.

A folha de pagamentos da prefeitura não ultrapassava os 40% da Receita Corrente Líquida.

Não existia um Ministério Público e um Judiciário tão atuante no que se refere a esfera pública e muito menos as chamadas redes sociais, que em segundos espalham por toda a cidade sentimentos negativos em relação aos governantes.

A Câmara de Vereadores pulou de 13 para 21 vereadores, aumentando a pressão sobre o poder público, a exemplo das associações comunitárias e sindicatos, a cada dia mais atuantes.

Ou seja, um cenário bastante distinto daquele em que construiu sua fama de bom gestor e tocador de obras.

Tião  Miranda está receoso sobretudo com a complicada situação econômica da prefeitura e a judicialização da política.

João Salame pagou cerca de R$ 65 milhões de dívidas do ex-gestor Maurino Magalhães, o que impediu fortemente que seu governo pudesse realizar as promessas que fez durante a campanha.

Em 2015 as receitas da prefeitura caíram cerca de R$ 35 milhões em relação a 2014, o que produziu a dívida do Instituto de Previdência que foi a responsável pelo seu afastamento.

Todo mundo sabe que Tião Miranda assumindo não vai pagar dívidas com fornecedores.

Aliás, ele já declara isso em alto e bom som.

Mas a preocupação dele é com a folha de pagamentos.

Ele sabe que não dá pra reduzir muito a folha nos chamados cargos de confiança (comissionados).

De uma folha de R$ 34,5 milhões eles representam hoje apenas R$ 1,5 milhão, aí incluindo os salários do prefeito, vice, secretários, diretores de unidades de saúde, diretores de secretarias e outros servidores que realmente trabalham.

Na Educação existem 39 cargos comissionados.

Na Saúde 57.

Não há muito o que mexer aí.

São poucos os chamados cargos apenas políticos.

Na folha de contratados são serventes, merendeiras, professores que trabalham na zona rural, auxiliares de enfermagem, engenheiros e outros servidores necessários para o funcionamento da máquina.

E não há como mexer com cerca de 7 mil funcionários concursados.

Qualquer demissão, além de produzir insatisfações, não é solução para a situação da folha.

Na realidade, o maior problema da folha é a educação.

A Semed (Secretaria de Educação) possui 5.145 servidores num total de 10.232 em toda a prefeitura.

Ou seja, tem 50,28% dos servidores.

E a folha de pagamento da educação corresponde a 59,30% da folha total da prefeitura.

Recente publicação da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro demonstra que 87% das prefeituras não vão cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal.

O gasto com a folha estourou com a queda das receitas em todo o País.

Em Marabá, o prefeito assumiu com a folha em torno de 58%.

Reduziu para 50%, mas agora, com a queda na arrecadação, a folha está por volta de 60% da Receita Corrente Líquida, muito acima do limite prudencial de 51,2% e muito acima dos cerca de 40% da época em que Tião foi prefeito.

Miranda sabe que é preciso mexer nesse vespeiro para impedir o descontrole financeiro da gestão, sob pena de perder sua imagem de bom gestor.

O mais grave, no entanto, é a combinação de queda de receita com vantagens concedidas pelos planos de cargos dos servidores, sobretudo na educação e saúde.

Na saúde, as gratificações criadas sobretudo no governo Maurino Magalhães elevaram a folha em quase R$ 1 milhão/mês, sem falar no aumento significativo dos valores dos plantões médicos.

Na educação, o rombo é estratosférico.

Nos dois últimos anos do governo Tião Miranda, o dinheiro que veio do MEC/Fundeb foi suficiente para pagar toda a folha da educação e ainda sobraram cerca de R$ 3 milhões, que lhe permitiu à época pagar até 14º salário.

No governo Maurino, o descontrole.

O dinheiro que veio do MEC/Fundeb foi suficiente para pagar a folha e ainda sobraram cerca de R$ 13 milhões.

Mesmo assim Maurino deixou a educação com um mês de salários atrasados, 4 meses de vale-transporte, 10 meses de vale-alimentação e dívidas enormes com a previdência.

Além de produzir o Plano de Cargos e Salários em 2011 que estourou a folha já no governo João Salame.

Resultado, nos 3 primeiros anos do atual governo o dinheiro que veio do MEC/Fundeb não só não foi suficiente para cobrir a folha, como produziu um déficit de cerca de R$ 115 milhões.

Ou cerca de quase R$ 3,2 milhões a menos por mês.

Ora, se o recurso próprio que a prefeitura precisa aportar para a educação é de cerca de R$ 3 milhões para completar os 25% de repasse obrigatório, o dinheiro não está dando nem pra pagar a folha.

E ainda tem transporte escolar, água, luz, telefone, aluguéis e outras despesas de custeio para pagar.

É uma bomba-relógio, que já explodiu no colo do prefeito João Salame e que é responsável pelo principal desgaste administrativo que está sofrendo.

O quadro é tão grave que as despesas com saúde e educação são crescentes. Consumindo praticamente toda a capacidade de investimento da prefeitura e não é suficiente. Com centenas de professores fazendo mestrado em busca de aumento salarial. Com pressões do Ministério Público para maiores investimentos na saúde.

Por determinação legal o prefeito é obrigado a investir pelo menos 15% da Receita Corrente Líquida em Saúde.

No governo João Salame foi investido 19,74% em 2013; 25,60% em 2014 e 25,38% em 2015.

Na educação o gestor tem que investir pelo menos 24%. O governo atual investiu 27,43% em 2013; 28,02% em 2014 e 33,85% em 2015. E não foi suficiente.

Além disso, o município deverá sofrer no próximo ano com o pagamento dos chamados precatórios, que são dívidas inscritas legalmente no Orçamento e que tem quem ser pagas por determinação judicial.

A previsão é que várias delas tenham que ser pagas a partir do ano que vem num montante que ultrapassa a casa dos R$ 20 milhões.

Tião Miranda sabe que não há previsão de crescimento da economia para alavancar de novo a arrecadação dos municípios. Nem a Vale nem o governo federal poderão abrir facilmente a bolsa de bondades. A situação fiscal do Governo do Estado também é apertada e Tião sabe que não poderá contar com muitos recursos por parte do governador Jatene.

Além disso. o deputado preocupa-se com a judicialização da política.

Ele teme tomar medidas duras pra ajustar a máquina e elas serem derrubadas na justiça, como tem ocorrido em todo o País. Teme as decisões quase cotidianas do Ministério Público determinando compra de medicamentos, reforma de unidades de saúde, de escolas e várias outras medidas que implicam em gastos que nem sempre estão entre as prioridades do gestor.

Esse é o quadro que traz insônia ao deputado Tião Miranda quando se trata de sua candidatura. Tanto que esses dias, após decidir ser candidato, informações dão conta que ele teve uma crise de mau humor por ter sido forçado por seu grupo a assumir a candidatura.

Muita coisa ainda pode acontecer até sexta-feira nos arraiais petebistas.

Pelos mesmos motivos João Salame reluta em ser candidato. Se diz com consciência tranquila de ter feito um volume de obras que ele afirma ser maior do que qualquer prefeito já fez na história da cidade, de ter urbanizado áreas de ocupação, inaugurado creches, escolas e postos de saúde climatizados e com qualidade superior a tudo que já foi feito, e realizado drenagens e pavimentações em volume maior que seus antecessores.

Mas Salame não é o típico político vaidoso. Sabe do desgaste de sua gestão. Identifica no pagamento de dívidas da gestão anterior e na queda brutal de receita os pilares que impediram de cumprir boa parte do programa que o elegeu.

E sabe ainda mais que o afastamento do cargo o penalizou duramente, projetando em parcelas consideráveis da opinião pública a ideia de que teria feito algo errado. E como se diz desde a época do Império Romano, “o importante não é que a mulher de Cesar seja honesta. O importante é que ela pareça honesta”.

Ou seja, a imagem é tudo.

Consciente das trairagens comuns no mundo da política, Salame reage tranquilo a elas e não se surpreende, mas revela-se cansado desse jogo depois de 24 anos de peleja.

A família o pressiona desde o ano passado para não se candidatar. Esposa, filhos e irmãos pedem que ele não se sacrifique. Que o fardo que recebeu foi muito pesado.

Mas os mesmos motivos que trazem dúvida a Tião estão fazendo a cabeça do atual prefeito: a  situação financeira caótica das finanças do município e a judicialização da política.

No caso de Salame ainda mais grave depois que se envolveu em denúncias contra práticas de corrupção no Tribunal Regional Eleitoral do Pará. Não por acaso 3 desembargadores que poderiam tê-lo retornado ao cargo já decidiram não decidir. Ou seja, procrastinaram.

Como enfrentar a campanha com os adversários dizendo que ele está afastado por supostas irregularidades?

E se ele for reintegrado ao cargo e for afastado de novo durante a campanha?

Salame sabe disso. Mesmo afastado ainda é o nome que reúne a maior quantidade de partidos, pelo seu carisma, sua capacidade de articular e de cumprir acordos.

É ainda novo, homem de confiança do ministro Hélder Barbalho, que pode ser o futuro governador do Estado. Tem um irmão deputado federal que controla o terceiro maior partido do País aqui no Pará. Uma moeda de troca importante na sucessão estadual e na disputa pelas prefeituras.

Disputando ou não essa eleição, Salame continuará a ser um político influente a nível estadual.

Pode dar um tempo e permitir à população que, sem as paixões do momento eleitoral, avalie o seu legado e todas as obras que realizou, sempre aberto para dialogar com as comunidades.

Entrar numa campanha agora significa exacerbar conflitos, potencializar aspectos negativos.

Por todos esses motivos é provável que o prefeito agradeça ao PMDB, que definiu por unanimidade apoiá-lo, e cerca de outros 7 partidos que continuam com ele, mas decida por retirar seu nome da urna eletrônica este ano.

Fora da disputa e, se retornar ao cargo, pode agir como magistrado, tendo em vista que possui boas relações com todos os candidatos.

Ou interferir de forma decisiva na reta final se a disputa se tornar equilibrada.