Padilha, o ministro sem plano de saúde

Luiz Claudio Pinheiro

“Eu sou médico, não tenho plano de saúde, sempre optei por não ter plano de saúde. Depois quando virei ministro, reconfirmei ainda mais não ter”, disse o ex-ministro no programa Roda Viva

No alvo de um tsumani de denúncias vazias, o ex-ministro da Saúde e pré-candidato ao governo paulista Alexandre Padilha compareceu na segunda-feira dia 28 ao programa Roda Viva, da TV Cultura. Uma matilha de jornalistas com perguntas afiadas o aguardava.

A entrevista de Padilha foi muito elucidativa a respeito da situação política, social e midiática do país. Propiciou vários insights sobre a realidade brasileira. De um lado, um time de jornalistas pronto a interromper o ministro a todo instante, a forçá-lo a não escapar da pauta, do cerco rígido de um enxame de perguntas capciosas adrede preparadas. Do outro lado, o ministro sempre firme e afirmativo, capaz, como ele diz, de impor-se na adversidade.

Mas houve um trecho peculiar da entrevista. Especialmente rico para entender o momento que vivemos. Desse trecho participaram dois jornalistas: o apresentador do programa, Augusto Nunes, e o repórter especial Germano Oliveira, do jornal O Globo. Além da tranquilidade objetiva do ministro, o diálogo em questão revela a indigência mental, o preconceito, a mediocridade arrogante, a alienação social e política dos jornalistas entrevistadores, dois em meio a tantos que como eles tentam fazer a cabeça de milhões de leitores e telespectadores Brasil afora. Transcrevo sem mais delongas esse trecho de entrevista, que transborda da prévia pauta, que fala limpidamente por si próprio:

Augusto Nunes – Estamos de volta ao vivo com o pré-candidato do PT ao governo de São Paulo, Alexandre Padilha. Vou fazer uma pergunta encaminhada pelo telespectador Ed Nascimento, de São Paulo. Peço que o Sr. responda tão concisamente quanto possível…

Alexandre Padilha – Faz igual no tuiter…

Augusto Nunes – Ministro, o Sr. já se tratou em algum hospital público?

Alexandre Padilha – Eu não tenho plano de saúde. Eu sou…

Augusto Nunes – Não tem?

Alexandre Padilha – Eu sou médico, não tenho plano de saúde, sempre optei por não ter plano de saúde. Depois quando virei ministro, reconfirmei ainda mais não ter. Também não tenho nada contra quem tem, a gente sabe – não sou daquelas pessoas que tentam tapar o sol com a peneira -, nós sabemos que precisamos avançar muito na saúde…

Augusto Nunes – O Sr. é um dos pouquíssimos brasileiros que não tem plano de saúde.

Alexandre Padilha – Não, a grande maioria dos brasileiros não tem.

Augusto Nunes – Não…

Alexandre Padilha – Quando começou…

Augusto Nunes – Não na faixa social a que o Sr. pertence.

Alexandre Padilha – Quando começou o governo do presidente Lula tinham 30 milhões de usuários de planos de saúde, quando eu saí do ministério tinham 50 milhões. Não sou contra quem tem, nós sabemos que precisamos avançar muito na saúde do país. Eu, nos três anos que fui ministro da Saúde – e o SUS está completando 25 anos de existência – tive a coragem de fazer aquilo que nunca tinha sido feito no ministério da Saúde, inclusive enfrentar as resistências para garantir pelo menos o básico, que é a presença do médico nos bairros mais pobres, nos municípios menores. E o nosso estado de São Paulo, embora seja o mais rico do país, foi exatamente o estado que mais pediu médicos. São mais de 2.500 médicos atuando na periferia das grandes cidades e nas cidades do interior de São Paulo.

Germano Oliveira – Eu ia perguntar por que São Paulo foi escolhido para ter mais médicos, se o plano era para ter mais médicos no interior do país. Mas o Sr. acha justo um médico do Mais Médicos ganhar R$ 1.000,00 por mês?

Alexandre Padilha – Em primeiro lugar, São Paulo tem muito interior, tem muita periferia…

Germano Oliveira – Mas não é o lugar mais pobre do Brasil, não é?

Alexandre Padilha – Não, mas tem muita gente pobre. Uma das coisas que nós temos que parar de achar é que não tem pobreza no estado de São Paulo. Aliás, talvez essa seja uma das coisas mais nocivas dos 20 anos de governo do PSDB. Como eles não tão ligados, não estão preocupados com os mais pobres, tentam passar a imagem de que não existiria pobreza em São Paulo.

Augusto Nunes – Mas quem diz que não existe miséria é a presidente Dilma.

Alexandre Padilha – Ela vai cumprir a meta de erradicar a miséria. O presidente Lula conseguiu cumprir e realizar seu sonho de enfrentar a fome, a presidenta Dilma vai erradicar a miséria. E nós temos que continuar avançando ainda mais no nosso país. Por isso a presidenta Dilma vai ganhar a eleição, porque ela está cumprindo suas metas. E mostrando claramente que é o PT, com a aliança que ela pode construir, que tem condições de avançar ainda mais. E é isso que nós vamos fazer no estado de São Paulo. Eu tenho muito orgulho, viu Germano, de tudo que nós construímos no estado de São Paulo até hoje.

Germano Oliveira – Mas o Sr. acha justo o médico receber mil reais?

Alexandre Padilha – O que era mais injusto, Germano, é brasileiro não ter médico.

Na sequência, Padilha conta a história de um motorista de ambulância de Cananéia (SP) que há 15 anos tinha viajar 70 quilômetros todo dia a uma determinada localidade, para buscar pacientes – mães, crianças, idosos – necessitados de atendimento médico. Desde dezembro, com a implantação do Mais Médicos, esse motorista não precisa mais fazer as viagens, porque já tem médico fixo na localidade.

O jornalista Germano insistiu na pergunta sobre o médico (no caso, o médico cubano) ganhar mil reais por mês. Padilha respondeu que os médicos cubanos recebem assim em cerca de 60 países, onde fazem parcerias similares a esta aqui com o Brasil. A maior parte do salário deles vai para a família em Cuba. Eles têm garantidos seus direitos sociais, e ficam, realmente, com uma parte pequena do salário. É assim que cumprem, destacou Alexandre Padilha, mundo afora, um papel extraordinário, de mudança de paradigma, no sentido da humanização do atendimento médico. Mudança de paradigma de efeito extraordinário nesse Brasil no qual até poucos meses atrás a grande maioria da população simplesmente não tinha qualquer expectativa de conseguir uma consulta médica.