Muito já se escreveu sobre a Guerrilha do Araguaia, a mais extensa e prolongada obra de resistência ao regime militar. De todos os ângulos, há versões de quem viveu a luta de um lado e de outro. Ninguém tem dúvidas: a Guerrilha do Araguaia se encadeia a muitas outras lutas de nosso povo ao longo dos tempos, entre as quais se incluem passagens memoráveis como a Revolta da Chibata, Quilombo dos Palmares, Cabanagem, Contestado, Canudos, Guararapes, Revolução dos Alfaiates, o Levante de 1935 e, atualmente, os movimentos dos que lutam por terra.

O tema vem à baila depois que vi, neste sábado, antiga foto mostrada por amigo contemporâneo em que aparecemos, ao lado de outros cinco colegas da mesma idade, com cara de espantados, assistindo na Praça Duque de Caxias, em Marabá, dois militares do Exército e um colegial hasteando o Pavilhão Nacional diante do busto de Caxias.

A foto registra um período em que os fatos, ocorridos à época, despertaram em mim a curiosidade de descobrir as razões que levavam nossa pequena e isolada cidadezinha, protegida no máximo por um destacamento de dez PMs, a ser invadida por milhares de soldados das três Forças Armadas. No verso da fotografia escrito com bonitas letras, a data de 25 de novembro de 1970.

Forçando a memória deu para lembrar daquela distante manhã, uma hora antes da solenidade na praça, em que estávamos sentados na beira-rio observando com olhares de incredulidade o que se passava do outro lado do Tocantins. A cidade toda estava ali.

De uma aeronave da Força Aérea Brasileira pára-quedistas se lançavam ao espaço tendo como destino a Praia do Tucunaré, reduzida a um pequeno banco de areia devido a cheia do rio que começava a tufar naquele mês de novembro. Antes de pisarem em solo, um dos saltadores, provavelmente o líder do grupo, desfralda uma bandeira do Brasil, que depois é conduzida até uma embarcação onde um outro militar a recebe dos pára-quedistas. O barco atravessa o rio e pára bem no porto onde nos encontrávamos assistindo tudo sem saber o que realmente se passava.

Solenemente, um militar desce da embarcação e entrega a bandeira a um oficial do Exército, que se desloca então em direção à praça Duque de Caxias. Nós e o restante da cidade, seguindo-o de perto.

Em frente ao prédio onde hoje funciona a Câmara Municipal, a bandeira é repassada a um estudante de um escola do município que, ao som do Hino Nacional, procede ao hasteamento do Pavilhão. Neste momento, alguém bateu a foto que eu nem sabia de sua existência.

Muitos anos depois tomei conhecimento: aquela solenidade de significado cívico materializou o fim da primeira grande operação militar realizada pelas forças armadas brasileiras na Amazônia, empregando efetivos das três Armas de várias unidades do país, na chamada Operação Carajás 70. A movimentação se constituiu numa espécie de adestramento conjunto dos militares e numa ação de presença e de dissuasão.

O general Emilio Médici tinha informações superficiais da presença de um foco de guerrilha rural na região conhecida como “Bico do Papagaio”.

Um ano e meio depois, em abril de 1972, os jovens e sonhadores militantes do PCdoB passaram a ser combatidos na região.