A Justiça Federal do Pará rejeitou nesta sexta-feira (16) denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal contra o coronel da reserva Sebastião Rodrigues de Moura. Conhecido como major Curió, ele comandou a operação de combate à guerilha do Araguaia, nos anos 70. Adenúncia, apresentada nesta quarta (14), o acusava de sequestro qualificado de cinco militantes da guerrilha, considerados hoje desaparecidos.

 

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Atualização às 18:38

 

Luis Nassif comenta a decisão:

 

A ação penal contra o major Curió foi distribuída para a 2ª VARA, cuja titular é a juíza Nair, tida pelos procuradores como a mais receptiva ao tema. Como ela estava de férias, a denúncia foi encaminhada a outro juiz.

O procurador da denúncia conversou com o juiz, esclarecendo todos os pontos, inclusive a coerência das teses defendidas. O ponto central da tese é que a lei da anistia valia para crimes cometidos antes da sua promulgação. Mas, no caso de prisioneiros desaparecidos, entende-se que a conduta só cessa quando é encontrado o corpo.

Se não havia provas da morte das vítimas, não havia materialidade. Portanto não se poderia falar em crime de morte antes da promulgação da lei, mas no crime do sequestro, que continuaria enquanto os corpos não fossem localizados. Mesmo que houvesse convicção sobre sua morte, não se poderia dispensar a produção de provas.

Foi lhe explicado que não haveria afronta à decisão do STF (Supremo Tribunal Federal). Foi mostrado a ele, inclusive, decisões do STF nas extradições.

Mas a posição do juiz foi irredutível, no sentido de não acolher a tese.

O indeferimento deu-se principalmente pela aplicação da Lei de Anistia. O juiz apenas mencionou rapidamente a decisão da Corte Interamericana (a que determina o afastamento da aplicação da Lei de Anistia para esses crimes) entendendo que não se aplica a fatos passados… Considera também que houve a morte presumida das vítimas, por isso Curió não pode ser processado por sequestro.

Agora, o MPF prepara o recurso, que será interposto pelos procuradores de Marabá.

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Atualização às 19:19

 

MPFP vai recorrer da decisão da Justiça

O Ministério Público Federal vai recorrer da decisão do juiz João César Otoni de Matos para que o coronel da reserva Sebastião Rodrigues Curió seja processado pelos crimes de sequestro contra guerrilheiros do Araguaia. Os procuradores da República que atuam no caso – do Pará, Rio Grande do Sul e São Paulo – já estão trabalhando no recurso que será dirigido ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

“Estamos efetivamente dispostos a cumprir a determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos que deixou clara a obrigação brasileira de trazer a verdade sobres os fatos que ocorreram naquele momento, de dar uma satisfação às famílias que até hoje não sabem o que ocorreu com seus parentes e também a cumprir o precedente do Supremo Tribunal Federal sobre vítimas de desaparecimento forçado”, diz o procurador da República Ubiratan Cazetta, um dos responsáveis pelo caso.

O procurador se refere à decisão da Corte da OEA sobre os crimes cometidos por agentes da ditadura na guerrilha do Araguaia que determinou ao Brasil “conduzir eficazmente, perante a jurisdição ordinária a investigação dos fatos do presente caso a fim de esclarecê-lo, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções”.

E também a decisões do STF em pedidos de extradição do governo argentino em que os ministros decidiram extraditar militares acusado de sequestro. “Embora tenham passado mais de trinta e oito anos do fato imputado ao extraditando (desaparecimento forçado de presos políticos), as vítimas até hoje não apareceram, nem tampouco os respectivos corpos, razão pela qual não se pode cogitar, por ora, de homicídio”, disse o ministro Ricardo Lewandowski, relator de um dos casos.

“Não existe convicção de que as pessoas estão mortas, portanto, é fundamental que a Justiça analise os casos, permita a produção de provas, traga à luz a história dessas vítimas. Não se pode simplesmente presumir sua morte sem mais indagações e dispensando-se a instrução processual”, considera o procurador da República Tiago Rabelo, que atua em Marabá e trabalha há mais de dois anos colhendo depoimentos e testemunhos sobre as operações de repressão no Araguaia.

Na decisão de não receber a denúncia criminal contra Curió o juiz Otoni Matos considerou – dois dias depois de receber o processo – que a Lei da Anistia (nº 6.683/79) impede qualquer tentativa de punir os crimes do coronel reformado. “Pretender, depois de mais de três décadas, esquivar-se da Lei da Anistia para reabrir a discussão sobre crimes praticados no período da ditadura militar é equívoco que, além de desprovido de suporte legal, desconsidera as circunstâncias históricas que, num grande esforço de reconciliação nacional, levaram à sua edição”, diz o juiz João César Matos.

Para o MPF, a denúncia criminal contra Curió não questiona a Lei da Anistia e sim observa os precedentes do próprio STF em casos análogos, além de obedecer a decisão da Corte Interamericana, porque o Pacto Interamericano de Direitos Humanos foi assinado pelo Brasil e tem força de lei no país. “Se o Brasil não quer cumprir o pacto, o que seria uma decisão política absolutamente desastrosa na minha opinião, a adesão do Brasil tem que ser desfeita, isso tem que ser feito oficialmente. O país voluntariamente aderiu ao pacto e a partir disso precisa cumpri-lo, não pode se recusar toda vez que uma decisão lhe desagradar”, argumenta o procurador Cazetta