Reeleito deputado estadual, João Salame (PPS) reconhece a necessidade de trabalhar projeto de formação de um novo bloco político que dê sustentação às lutas que a população de Marabá precisa empreender para superar suas adversidades, agora cada vez mais multiplicadas com o surgimento de grandes empreendimentos siderúrgicos em seu entorno.

De maneira discreta, o anúncio revela postura do parlamentar de expressar seu afastamento do grupo ao qual pertence o ex-prefeito de Marabá, Sebastião Miranda (PTB),  eleito deputado estadual, e que se tornou seu  principal adversário na disputa eleitoral  que ambos travaram buscando vaga à AL.

A entrevista de João Salame, concedida hoje ao blog:

P- 75% dos 22.127 votos que o povo paraense lhe conferiu, reelegendo-o deputado estadual, foram obtidos fora de Marabá, seu reduto eleitoral. Em decorrência dessa votação “fora de casa”, pressupõe-se que você planejou sua campanha preocupado com o efeito Tião Miranda (PTB)- que saiu de Marabá com 35% dos votos, enquanto sua votação não passou de 5% -, ou o resultado é conseqüência de trabalho parlamentar realizado nesses quatro anos em outros municípios?


JS- As duas coisas. Quando percebi, pelas pesquisas que tinha, que o Tião ia estourar de votos em Marabá, decidi priorizar a campanha nos outros municípios. Dos sessenta dias de campanha fiz apenas dezoito em Marabá. Colaborou também o trabalho que realizei em outros municípios.

P- Você ficou decepcionado com a votação obtida em Marabá?

JS- Esperava um pouco mais, mas não fiquei decepcionado. Os erros cometidos são de minha responsabilidade. Fiquei ausente em função de dedicar muito tempo a outros municípios, não coloquei equipes de rua, fiz poucas caminhadas e investi poucos recursos na estruturação da campanha em Marabá. Uma opção que fiz para não sair endividado. Acho também que me distanciei das lutas da comunidade e foi falha a comunicação de tudo o que fiz e consegui para Marabá. Mas é bom lembrar que as candidaturas do Tião e do Ferreirinha atingiram em cheio um eleitorado que poderia votar em mim. Sem contar que a estrutura financeira da campanha deles, da Irismar e da Bernadete eram muito maiores que a minha. No resto os erros são de minha responsabilidade e eu vou procurar corrigi-los. Diante de tudo isso, hoje analiso que quase seis mil votos não é pouco. Diante de todas as adversidades e erros é muita gente acreditando em você. Eu tenho que valorizar e ampliar isso.

P- Meses antes da realização das convenções partidárias que definiriam as candidaturas majoritárias e proporcionais, você tentou, várias vezes, convencer Tião Miranda a concorrer a uma vaga a deputado federal, numa estratégia de dobradinha. Em todas as tentativas, consta que Miranda as recusou peremptoriamente, havendo inclusive, em decorrência, o atritamento das relações entre vocês dois. Passada a eleição, quem estava certo, você ou ele? Tião conseguiria eleger-se deputado federal?

JS- Nunca houve atrito entre nós. O projeto principal nosso era indicá-lo para vice-governador. Ele queria apoiar o Jatene e o partido dele, o PTB, decidiu apoiar a Ana Júlia. Isso inviabilizou esse projeto. Ele manifestava simpatia pela candidatura de deputado federal, mas achava que não tinha chances. Mas só soube da candidatura dele a deputado estadual uma semana antes das convenções. Nesse dia tivemos um diálogo duro. Disse a ele tudo o que pensava. Que ele não estava agindo de maneira correta. Que ele não queria ser deputado estadual, mas apenas fazer uma ponte para a prefeitura. Que ele poderia me prejudicar, que tinha que pensar no nosso grupo, mas nada disso adiantou. Ele argumentou que tinha que proteger seus interesses políticos conquistando um mandato e as pesquisas que ele tinha diziam que ele se elegia para estadual. Achava que nós dois tínhamos chances de eleição. Como vi que não adiantava argumentar lhe desejei boa sorte. Hoje, avalio, como avaliava, que ele se elegeria deputado federal. Mas ele é muito pragmático e não quis arriscar.

P- Esse grupo ao qual você se refere ainda existe?

JS- Não. Ele tomou a decisão de dividi-lo. Temos muitos amigos em comum, nossas relações são cordiais, mas não posso mais dizer que pertenço ao grupo que ele liderava, como era antes. Talvez nesse aspecto ele tenha me feito um bem. Muitos diziam que meu primeiro mandato só foi conquistado por causa dele. Agora eu conquistei esse mandato contra ele. E apesar de ter diminuído os votos em Marabá, cresci minha votação em quase 50% em todo o estado. Eu sou um cara determinado. Agora vou trabalhar duro pra reconquistar espaço em Marabá e sei que vou conseguir. Sem raiva. Sem rancor. Na prática o Tião me libertou da decisão que eu tinha de acompanhá-lo em todas as circunstâncias. Agora só vamos estar juntos novamente se isso for bom pra Marabá, se for bom pra ele, pra mim e para as lideranças que me acompanham.

P-Sabe-se também que meses antes das convenções você convidou o presidente do Águia de Marabá, Sebastião Ferreira, a filiar-se ao PPS, abdicando da candidatura dele a deputado estadual pelo PT para coordenar a sua campanha pela reeleição. Pelo acordo, na eleição para Prefeitura de Marabá em 2012, você ou ele seria o candidato do PPS a prefeito, dependendo de quem aparecesse melhor nas pesquisas. Essa manobra, rejeitada pelo Ferreirinha, já fazia parte de sua estratégia de evitar a dispersão de votos na cidade num embate direto com Tião Miranda?

JS-Eu temia que Marabá ficasse sem deputado com tanta divisão. Comentava-se sobre o desgaste da Bernadete e que o Tião precisava de muitos votos. E eu e o Ferreirinha disputávamos o mesmo eleitorado. Ainda bem que elegemos três deputados, mas se as coisas dessem errado poderíamos não ter eleito nenhum. Além disso temos uma boa relação. Eu avaliava que seria difícil para ele emplacar uma vaga no PT, que tinha nomes muito fortes. Por isso lhe fiz uma proposta de aliança. Incluía ele coordenar minha campanha, se filiar ao PPS e a gente reforçar o time do Águia. Seria minha última disputa para estadual. Nas próximas eleições ele se candidataria com o meu apoio. Significava, evidentemente, que estaríamos juntos nas eleições para prefeito. Apoiando alguém ou lançando candidatura. Mas ele não aceitou. Avaliava que se elegia deputado com o apoio da governadora.


P-Vou mais adiante: reeleito deputado estadual, o seu nome, logicamente, em 2012, estaria intensamente mais exposto na mídia do que o de Ferreirinha, havendo, portanto, um forte recall a seu favor. Essa não é daquelas propostas “pensando em mim” que lhe dava a certeza de que as pesquisas dois anos depois seriam favoráveis a você?

JS-Não. O nome mais forte já era o do Tião Miranda. Pra ganhar a eleição o mais provável seria apoiá-lo. No PPS o nome do Ferreirinha passaria a ser forte para compor a chapa como vice e se preparar para deputado em 2014. Se fosse para disputar sem muitas chances, para fortalecer um nome, ele poderia ser o candidato a prefeito. Eu não precisava mais disso, só disputaria se fosse com reais chances de vitória, o que seria muito difícil com a força da candidatura do Tião e a máquina a favor do Maurino. Por outro lado, pela chapa que nós montamos, eu tinha quase certeza que me reelegeria e sabia que as chances do Ferreirinha eram menores por causa do grau de dificuldade da chapa do PT. Se fosse visto de forma racional o acordo era bom pra ambos. Aliás, a vida demonstrou que a experiência não foi boa para ele.

P- O governador eleito Simão Jatene ofereceu ao PPS a vice-governadoria. Com objetivo estratégico de melhorar o desempenho dele no Sul do Pará, sabe-se que você teria sido convidado, sem sucesso, a ocupar o cargo. Fracassada a tentativa de lhe colocar na chapa de Jatene, o PSDB partiu pra Santarém, convidando o Helenilson Pontes, agora vice-governador. Ao recusar o desafio de fazer parte da chapa do governador eleito, você temia pelo sucesso da empreitada , preferindo lutar pela sua reeleição, ou a história não é bem assim como está sendo contada?

JS-Não é bem assim. Eu não fui convidado para ser vice. Houve especulações de bastidores, mas o PPS definiu com muita antecedência que o Helenilson seria nosso candidato a vice. Ele não queria ser candidato a deputado. E nós tínhamos a avaliação que o Jordy era o único de nós que tinha chances de se eleger deputado federal e eu tinha uma eleição tranqüila para deputado estadual. Por isso o partido preferiu não arriscar. O Jatene aceitou a indicação do partido. Diga-se de passagem o Helenilson é um bom companheiro e um cara super preparado. Vai representar bem o PPS.

P- Em 2006, Ana Júlia convidou, também sem sucesso, o empresário Leonildo Rocha, dono do Grupo Leolar, a fazer parte da chapa dela como candidato a vice-governador . Deu que outro santareno, Odair Correa, tornou-se vice-governador. Em duas seguidas oportunidades Marabá perdeu a chance de colocar um representante no Governo Estadual. Falta mais audácia ou astúcia, aos políticos marabaenses, quando o assunto é ampliar sua representatividade política?

JS-A sorte não está conspirando a nosso favor. O Tião poderia ter sido o vice, mas o prefeito de Belém, Duciomar Costa, preferiu colocar o PTB na base de apoio da Ana Júlia. Eu já expliquei minha situação. Mas a hora de Marabá e da nossa região está amadurecendo. Nós estamos crescendo muito econômica e politicamente. Não é à toa que Marabá elegeu três deputados estaduais e um federal. Nenhum deles na sobra.

P-Ainda sobre esse assunto: entra ano, sai ano, e mais uma vez não se consumou a presença de importantes nomes dos chamados setores produtivos de Marabá no cenário político. Por que os empresários reclamam tanto, mas na hora da onça beber água, saem faceiros, sem assumir algum tipo de candidatura aos diversos cargos oferecidos pela democracia?

JS-A maioria dos empresários que gosta da política quer acender uma vela pra Deus outra pro Diabo. Quer estar bem com o prefeito, com o governador e quando há disputa com os candidatos. A maioria tem medo de se expor e ser perseguida caso o candidato que está apoiando perca a eleição. Uns tem medo do fisco. Outros porque querem entabular negócios com o governo. Querem ganhar sempre. Mas aos poucos começam a aparecer os que topam arriscar. Os que se preocupam com as questões coletivas que exigem participação política.

P-Daqui a dois anos, de novo, Marabá escolherá seu prefeito. De cara, nem bem terminaram as eleições, o deputado estadual eleito Tião Miranda já está em campanha rasgada, cooptando cabos eleitorais de outros políticos e lideranças comunitárias. Uma delas, o Aurélio, irmão do presidente do Águia, Ferreirinha, já recebeu convite dele para disputar uma vaga à Câmara Municipal. Esse posicionamento do Tião não denota certo tipo de estelionato eleitoral, já que ele acaba de se eleger deputado, visando exclusivamente voltar à Prefeitura de Marabá?

JS-O Tião nunca negou pra ninguém que seu principal objetivo é voltar a ser prefeito. A maioria das pessoas que votou nele sabe disso. Aliás, muitos votaram achando que estavam escolhendo um prefeito em protesto contra a administração do Maurino. Portanto não se pode falar de estelionato quando o povo quer. O mesmo povo que quis o Maurino decidiu agora ter um deputado provavelmente de dois anos. Ou que talvez nem assuma o mandato, pois está sendo cotado para assumir uma secretaria de Estado.

P- E nesse cenário de Tião Miranda já pré-candidato a prefeito, ele pode ser considerado imbatível nas urnas ou uma boa engenharia político-partidária, com você dentro dela, pode perfeitamente derrotá-lo?

JS-É preciso ter humildade diante do recado claro das urnas. O povo votou no Tião pra deputado como se estivesse votando pra prefeito. A candidatura dele, portanto, é fortíssima. Claro que não existe ninguém imbatível com dois anos de antecedência. O bonito da política é que ela é dinâmica. Quem diria que a Ana Júlia derrotada para prefeitura de Belém seria governadora dois anos depois? Que o Jatene ganharia a eleição, com o PSDB dividido, com o Almir Gabriel atirando nele, o DEM sem o Vic e a Valéria; a Ana com 14 partidos, a máquina do governo e o apoio do Lula do lado dela? Quem diria que o Duciomar, com a rejeição altíssima que tinha, seria reeleito prefeito de Belém? São os imponderáveis da política. O próprio Maurino, que faz um governo muito ruim, conseguiu dar mais de 11 mil votos pra candidata dele a deputada estadual dentro de Marabá. Ele está muito desgastado, mas não está morto. Nada impede que ele possa corrigir rumos e se torne um candidato competitivo. A lógica hoje não é essa. É a do retorno do Tião. Mas vai depender de como ele, o Maurino e os outros agentes políticos vão se comportar nestes dois anos. Quanto a mim vou corrigir rumos e fortalecer o mandato, especialmente em Marabá. Quero estar mais ligado nas lutas da sociedade. Em 2012 quero influenciar no processo, sendo ou não candidato. Não para costurar frentes contra essa ou outra candidatura, mas articulando um bloco de forças em favor de Marabá. Para a formação de um governo que seja acessível, que dialogue com a sociedade, mas que tenha competência e seriedade na aplicação dos recursos públicos.

P- É dada como favas contadas a nomeação de Tião Miranda para a Secretaria Estadual de Transportes. Se isto realmente ocorrer, não há dúvidas de que ele se tornará mais poderoso, com armas de “persuasão” fulminantes para a montagem de uma estratégia eleitoral localizada no município. E a você, pra contrabalançar o coreto, não está reservada nenhuma secretaria, no governo Simão Jatene?

JS-É bom lembrar que antes do PSDB definir quem era o seu candidato (Jatene, Mário Couto ou Almir Gabriel), o PPS já tinha aprovado que o Jatene deveria ser o candidato e contaria com o nosso apoio. Foi o primeiro partido a definir isso de forma clara. Temos o vice-governador e o deputado federal mais votado da coligação. Em 2006 esse bloco elegeu 24 deputados estaduais e só 8 retornaram para a Assembléia. Eu sou um deles. A Bia Cardoso, minha esposa, é suplente de senadora do Flexa Ribeiro e se destacou na campanha. Um nome que surge. Portanto, mostramos força. O governador já me assegurou que o PPS terá espaço importante no governo e meu mandato será muito prestigiado. Eu confio nele. Ficamos de conversar novamente no final do mês sobre essa participação. Quanto ao Tião assumir uma secretaria considero que é bom pra Marabá e região. Sempre defendi a tese de que devemos ocupar esses espaços. Não posso agora pensar diferente em função do nome que está sendo indicado. Até porque ele tem competência nessa área.

P- Passados quase 15 quinze dias da eleição, quero uma avaliação sua, apesar das várias análises tornadas públicas de algumas personalidades, sobre o tema. Ana Júlia perdeu pra ela mesmo, ou para o governador eleito Simão Jatene?

JS-Eu sempre disse que quem fosse para o segundo turno contra a governadora ganharia. Ela perdeu para seus próprios erros. O próprio Jatene diz que se o governo dela tivesse sido razoável ele não disputaria a eleição. É evidente que a candidatura do Jatene, que tem muitos serviços prestados ao Estado e é um dos técnicos mais capacitados de sua geração ajudaram na vitória tucana, além do marketing perfeito que teve. Eu acho a Ana uma boa pessoa, mas ela fez quase tudo errado. Se cercou de um grupo sem experiência política; se isolou do próprio PT; na prática expulsou o PMDB do governo; teve uma relação arrogante e enganadora com os deputados e perdeu a maioria na Assembléia Legislativa; não teve controle sobre setores vitais do governo, como as secretarias de educação, saúde, segurança, meio ambiente e transportes e se comunicou mal com a sociedade. Essa combinação foi explosiva e levou sua rejeição à estratosfera. Não tinha como ganhar.

P- Poucas pessoas estão atentas a essa percepção que te passarei agora. Marabá atravessa o momento mais delicado de toda a sua história, vivendo expectativas diversas diante da implantação de projetos como a siderúrgica da Alpa, Hidrovia do Tocantins, início real da pavimentação da rodovia Transamazônica, etc. Momento delicado por que, se considerarmos o que todas essas intervenções provocam no seio da sociedade sem que haja ações paralelas para a contenção do caldo marginal,l nada está sendo feito. Ao contrário, há um estado cego de contemplação perigosíssimo capaz de ampliar mazelas. Por exemplo, o boom imobiliário já estourou na cidade, com praticamente todos os projetos voltados às classes média e alta. A periferia está encharcada, até o talo, de pessoas sem teto e desqualificadas para a conquista de empregos. Há um cenário perigoso em volta do “bolo enfeitado” que precisa ser diagnosticado urgentemente para possíveis soluções. O que o deputado João Salame, reeleito, desenha como meta de atuação parlamentar diante dessa bolha explosiva?

JS-Por isso que digo que devemos nos unir em torno de um projeto a favor de Marabá e não contra esse ou aquele político. Um novo bloco de forças que entenda que o poder público municipal não pode ser aprisionado pelos interesses de um pequeno grupo. Que os recursos devem ser otimizados para diminuir o gigantesco déficit social que existe. Que as prioridades precisam ser discutidas com a população. Que a aplicação dos recursos deve ser feita não só de forma competente, mas, sobretudo, de forma transparente, para que a sociedade saiba onde está sendo gasto cada centavo de seu dinheiro, impedindo assim que o erário público se transforme em fonte de enriquecimento dos governantes de plantão. Um projeto que encare sem demagogia e sem autoritarismo o grave problemas das áreas de ocupação e a questão da moradia popular; que invista pesado em educação e formação de mão-de-obra, com a implantação de escolas técnicas, novas faculdades e fortalecimento do ensino fundamental e médio. Uma política para saúde que deixe de ser a enganação que perdura há anos e transforma o usuário do sistema num estorvo. Uma política de geração de emprego e qualificação dos trabalhadores que diminua a brutal concentração de renda que existe no município. Esses são os desafios. Eu vou me dedicar mais a isso. Vou usar toda a minha capacidade de trabalho e a influência que conquistar no próximo governo para caminhar nessa direção. Olhando pra frente. Procurando unir a sociedade marabaense em torno de um projeto. Essa será a minha contribuição.