“Escorpiões são animais fascinantes”.

Não poderia haver termo mais adequado, expressivo e significativo, aí empregado numa opção feliz: fascinantes. Fascinantes por sua antiguidade, por sua adaptabilidade, por sua estabilidade, por sua ampla distribuição e pelos inúmeros problemas relacionados com o seu modo de vida, ecologia, biogeografia, sistemática, veneno etc. Fascinantes enfim para os pesquisadores que fazem deles seu material de trabalho.

Mas praticamente todos sabem que escorpiões são animais peçonhentos e perigosos. Essa é a idéia que domina. Poucos sabem, todavia, que contra cerca de 25 espécies realmente perigosas, há quase um milhar e meio de outras, cujas picadas não causam nenhum dano sério (Polis, 1990). Influenciado por essas 25, porém, o povo generaliza a periculosidade dos escorpiões e, ipso facto, os detesta, a todos, criando em torno deles uma atmosfera sombria, frequentemente carregada de inverdades.

Comumente, eles abrigam-se sob pedras, troncos caídos, cascas de árvores, pilhas de tijolos ou de telhas, montes de entulho, termiteiros, etc. Vários cavam galerias no solo, fazendo delas abrigo e regulador de condições climáticas.

Segundo Bücherl (1969), os componentes protéticos constituem 69% do veneno de T. bahiensis. São proteínas neurotóxicas as responsáveis pela toxidez dos venenos escorpiônicos (Rosenfeld, 1965; Brazil, 1982). Embora sejam poucas as espécies realmente perigosas, o escorpionismo, em certos lugares, constitui sério problema de saúde pública. Os casos de morte por picada de escorpião no Brasil são, em sua quase totalidade, causados por T. serrulatus, sem dúvida, a espécie brasileira mais importante do ponto de vista médico (Magalhães, 1939; 1946; 1946-47; Rosenfeld, 1965; Bücherl, 1970). Ocorre na Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Goiás, e principalmente Minas Gerais (Bücherl,1968-69). Em segundo lugar vem T. bahiensis, cuja área de distribuição vai da Bahia ao norte da Argentina, Mato Grosso do Sul, Paraguai.

Onde há problemas de escorpionismo, é recomendável evitar, nos quintais e adjacências das casas, amontoados de madeira velha, tijolos, telhas, montes de entulho, tudo enfim que possa oferecer abrigo a escorpiões. Essa é uma das mais importantes providências a serem tomadas para atenuar o problema. As pessoas devem habituar-se a não pegar panos de limpeza, roupa suja ou quaisquer objetos, sem olhar onde vão por as mãos. Também devem virar com sola para cima e sacudir vigorosamente cada pé de calçado antes de calçá-los, fazendo com que um escorpião que eventualmente se encontre dentro dele, seja lançado para fora, evitando assim uma ferroada. Gretas de paredes, muros, pisos etc. devem ser calafetadas, para eliminar possíveis esconderijos. É também importante a limpeza de porões, depósitos de lenha ou de qualquer outro material que possa contribuir para abrigar esses aracnídeos, ou animais que lhe sirvam de alimento (baratas, grilos etc).

Os escorpiões são artrópodes que pertencem ao grupo dos Aracnídeos. Estudos paleontológicos indicam que seus ancestrais são oriundos de formas aquáticas viventes no período Siluriano e que ao longo desses milhares de anos sofreram poucas modificações morfológicas.

A maioria das espécies é especialista: normalmente produzem uma única prole (após uma inseminação), possuem um ciclo de vida longo e são endêmicas de determinadas regiões e ecossistemas; capacidade reduzida de dispersão e formam pequenas populações.Já as espécies generalistas, podem produzir várias proles com uma única inseminação, possuem um ciclo de vida rápido, vivem bem no ambiente perturbado e formam grandes populações.

Suas aproximadamente 1.500 espécies se distribuem por todos os continentes (exceto Antártica), podem viver nos elevados picos montanhosos, ou em galerias subterrâneas muito profundas, em ambiente árido e em florestas extremamente úmidas. As regiões com maior diversidade de escorpiões estão no Equador, sul da Colômbia, norte do Peru, e oeste do Brasil.

Aproximadamente 80 espécies se distribuem pelo território nacional e são encontrados em praticamente todos os ambientes. Das 25 espécies causadoras de acidentes graves no mundo, três são relativamente comuns no Brasil: Tityus serrulatus, T. bahiensis e T. stigmurus. Estas espécies pertencem à família Buthidae, responsável por acidentes severos em muitos países. Muitas outras espécies podem causar acidentes dolorosos, porém sem maiores complicações. O escorpionismo no Brasil, e em outros países, são considerados um problema de saúde pública não só pela grande freqüência em que aparecem e causam acidentes, mas também pela gravidade dos mesmos, com centenas de casos fatais anualmente. São animais predadores que se alimentam principalmente de insetos. Estes animais são importantes para o equilíbrio ecológico, estabilizando as populações de insetos indesejáveis e por isso não devem ser eliminados indiscriminadamente.

Normalmente as florestas da região peri-domiciliar funcionam como um reservatório para os animais peçonhentos. Como o homem destrói o ambiente onde estes animais vivem, tendem a migrar para as áreas rurais e para os centros urbanos. Boa parte dos escorpiões que aparecem em residências (até mesmo em edifícios) utilizam as galerias de esgoto e drenagem de água para se locomoverem, um ambiente de difícil acesso ao controle químico.

Os escorpiões são sensíveis aos inseticidas convencionais desde que entrem em contato direto com a superfície do corpo: a região ventral é dotada de vários estigmas respiratórios e laterais do corpo são formadas por membranas que podem absorver estes compostos, porém na maioria dos casos os escorpiões permanecem muito bem escondidos e dificilmente entram em contato com esses inseticidas.

Em caso de acidente com escorpiões procure imediatamente atendimento especializado e se possível leve o animal para uma identificação correta.

Visão dorsal do corpo.

O Museu Municipal de Marabá, gerenciado pela Fundação Casa da Cultura de Marabá, mantém uma boa coleção de artrópodes com fins científicos e didáticos. Na coleção há cerca de 200 escorpiões das seguintes espécies ocorrentes em nossa região: Tityus cambridge, Tityus metuendus, Tityus silvestris, Tityus paraensis, Tityus strandi, Botriurus sp e Opistacanthus sp.

Nenhuma dessas espécies é considerada potencialmente mortal para seresw humanos, apesar de sua picada ser bastante dolorosa. No entanto, pessoas alérgicas, idosas e crianças certamente são mais sensíveis às picadas e podem vir a ter sérias complicações.

 

Texto: Noé von Atzingen, Presidente da Fundação Casa da Cultura de Marabá