A fala desesperadora de uma usuária do Hospital Municipal de Marabá, enviada ao blog, resume a situação caótica pela qual passa a população, na área de saúde.
Maria de Lourdes Teixeira, 52 anos, faz um resumo da gravidade do problema de saúde, ao citar que a estrutura do Hospital Municipal de Marabá é uma das mais precárias, entre todas as unidades hospitalares municipais do interior do Estado.
Diz ela na gravação:
– “Você fica com vergonha do que vê no Hospital Municipal de Marabá. Aquela multidão de gente lá dentro, sem ter espaço nem para tomar um soro. Agora, pra piorar, eles pegaram o corredor onde o povo ficava sentado esperando, e colocaram um bocado de ganchos na parede para que os pacientes fiquem tomando soro sentados nas cadeiras do corredor. Lá dentro é impossível ter um leito para alguém. Então, fica aquele monte de gente esperando ali pelos primeiros socorros, os primeiros atendimentos, todos tomando soro, pacientes de camisola andando no meio do povo. Quem está com Covid, passando por cima de quem está ali com o braço machucado. É assim um negócio insalubre o que a gente vê ali dentro do Hospital Municipal de Marabá. Eles têm um mapa lá dentro dizendo que Marabá atende a população do município e de mais 22 municípios da região. E quando a gente sabe que, só Marabá já passa de 300 mil habitantes, e mais essa quantidade de municípios arredores, é só fazer um cálculo para chegarmos a uma população grandiosa para ser atendida por um único hospital público municipal de acesso a todos, considerando que o Hospital Regional de Marabá não é de acesso a todo mundo, para atender uma média altíssima de pessoas doentes. A gente não entende o que se passa na cabeça dos governos que não se unem para construir um hospital novo, e digno, em Marabá”.
Mais à frente, na gravação, Maria de Lourdes não deixa de registrar sua indignação também com o péssimo atendimento do único hospital privado de Marabá, o Hospital Unimed.
– “Lá no Hospital Unimed, eles estão mandando pacientes para o Hospital Municipal de Marabá, os usuários do plano de saúde chegam lá no Hospital Unimed com Covid-19 e são informados de que não está tendo leitos, não tem espaço… Sabe o que eles estão fazendo? Coloca o doente na ambulância da Unimed, leva enfermeiros de dentro do Hospital Unimed pra ficar acompanhando pacientes internados no Hospital Municipal”.
PREFEITO INSENSÍVEL
Trocando em miúdos, Marabá é servida apenas por dois hospitais abertos, já que o Hospital Regional, de média e baixa complexidade, tem regulação.
Um público. Outro privado.
A gravidade da situação acentua-se a cada mês, principalmente depois da explosão dos casos de Covid-19.
A cidade não é digna de receber da prefeitura municipal um tratamento diferenciado na área de saúde.
Como bem diz um dos médicos que atende no Hospital Municipal, que pede anonimato por razões obvias:
– “O prefeito de Marabá deveria ter o mínimo de sensibilidade e lutar por recursos para construir um hospital estruturado, que venha atender também expectativas de populações de outros municípios já que somos um polo regional que atrai de tudo, principalmente doentes. Não é mais admissível a população pobre ficar jogada num corredor do hospital sem nenhum respeito. A família que tem recursos, essa corre logo para outro centro que tenha atendimento à altura”.
E essa questão de construção de um novo hospital em Marabá não é de hoje.
Em toda campanha política, explode com mais intensidade, uns e outros prometendo o tão sonhado hospital que nunca chega.
“O prefeito Tião Miranda já está no comando político da cidade praticamente há mais de vinte anos, tempo suficiente para que ele tivesse a preocupação em já ter deixado a cidade com um hospital público à altura do tamanho do município. Não, ele nada faz nesse sentido, esmera-se apenas em construir “puxadinhos” no Hospital Municipal que exigem muitos recursos e baixo retorno clinico=hospitalar”, ataca o mesmo médico.
As críticas à falta de estrutura do Hospital Municipal de Marabá, ouvidas junto a algumas enfermeiras, auqelas pfossionais que mais sofrem i impacto da precariedade do setor, vão desde a questão da espera para o atendimento,com salas de espera lotadas, à questão da própria lotação.
“O local está tão lotado com pacientes que não estão com Covid-19, que médicos e enfermeiros mal têm espaço para se aproximar das macas e cuidar dos doentes. Eles estão aglomerados nos corredores, isso é verdadeiro, basta entrar aqui dentro de checar”, disse uma pessoa ouvida pelo blog.
Outra profissional da área de enfermagem também apresentou suas observações.
“Por conta da lotação, os profissionais que atendem lá dentro não dão conta porque vai chegando Samu, chega paciente para intubar, fica tudo misturado ali. Aí chega aquela portinha, ali eles vão enfiando o paciente, vai encaixando um em cima do outro como se fosse um lego. Então as pessoas estão sobrecarregadas, elas realmente tentam fazer o melhor que dá, só que o melhor que dá é muito ruim porque eles não dão conta mesmo da demanda”, afirma.
“É muita gente e a população está muito grande e a gente quer pelo menos mais um outro hospital e mais postos né”, sugere uma médica, ouvida pelo celular.
Sem aceitar mencionar sEU nome, um dos servidores que atua na área administrativa diz que O prédio tem uma estrutura antiga.
“A prefeitura tenta adequar, fazendo pequenas intervenções para que a gente possa atender a população com melhor qualidade, mas isso nunca vai resolver”, diz.
LINHA DO TEMPO
Na linha do tempo, impressiona como o município de Marabá regrediu, ao longo dos últimos 20 anos, na área de saúde – excluindo o tempo da gestão do médico Geraldo Veloso, que construiu centros e postos de saúde, além de ter melhorado consideravelmente o Hospital Municipal e ter construído o Hospital Materno Infantil.
Na décadas de 80 e 90, quando tinha 1/4 da população atual, o município de Marabá possui quatro vezes mais hospitais do que nos dias de hoje
A ver: Hospital Celina Gonçalves (Nova Marabá), Hospital Santa Terezinha (velha Marabá), Hospital Menino Jesus (Cidade Nova), Hospital . Dr. Veloso. (Velha Marabá), Hospital Morada Nova de propriedade do Dr. Botelho e o Hospital Climec, todos privados.
Além de muito mais hospitais, o número de médicos atendendo a população era superior aos dias atuais, quando temos quase 300 mil habitantes.
Num levantamento superficial, o município possuía mais de 500 leitos, àquela época.
Hoje não passa de 300.
O blogueiro fez uma breve pesquisa na Internet e encontrou números entre os municípios de Gurupi, no Tocantins, e Marabá, assustadores, comparando as diferenças de estrutura.
Naquele município, com população de 90 mil habitantes estimada pelo IBGE em 2020, existem quatro hospitais privados, que oferecem cerca de 300 leitos.
Dois hospitais públicos, comando mais 150 leitos.
Ouvido pelo blogueiro, o médico de Marabá Fernando Monteiro deu o seguinte depoimento sobre a falta de estrutura na área de saúde no município, comparando os últimos 40 anos
– “Marabá é um fenômeno. Acontecem coisas em Marabá que não se explica. Alguns anos atrás, nos tínhamos o Hospital Celina Gonçalves com 75 leitos. Tínhamos os hospitais Climec, Santa Terezinha, o Hospital do Sesp e Materno Infantil. Simplesmente, o Celina Gonçalves foi fechado. Na época o Demétrius (Ribeiro, empresário assassinado tempos atrás que havia comprado o hospital e depois o fechou) passou um cadeado, fechando o hospital. Isso não existe em lugar nenhum do mundo. Não se fecha hospital. Hospital é um bem público. Não se corta luz de hospital porque faltou pagamento de conta de consumo, porque o hospital é um bem público, tem que ter um outro olhar. Pois bem, naquela época, simplesmente o Demetrius fechou o Celina Gonçalves e ficou por isso mesmo. O poder público, nenhum vereador, a população, ninguém se manifestou contra o fechamento daquele importante hospital. Simplesmente o hospital foi fechado como se fecha um comércio qualquer, uma mercearia, um açougue. Então em razão disso, nos perdemos um hospital com a grandeza do Celina Gonçalves…. Mais, é bom dizer, se não tivessem fechado o Celina, o que teria acontecido? O governo do Estado teria construído um hospital regional, porque precisava de qualquer maneira, e a população teria um ganho a mais. E eu não compreendo como, apesar disso, nos dias atuais, a gente não vê mulheres ganhando neném na porta de hospital, paciente morrendo na porta de hospital por falta de leito… Ficou somente o Hospital Unimed (antiga Climec) no setor privado, com 45 leitos, e por incrível que pareça, a taxa de ocupação, teve mês que beirou 50%. Provavelmente, quem tem condições, vai embora de Marabá em busca de tratamento, não fica aqui na cidade, só pode ser essa a explicação. Então, houve nesses últimos 20 anos um encolhimento muito grande do número de leitos na cidade”.
Ao ser indagado sobre as razões que não levam alguns médicos e empresários a investirem na construção de hospitais privados em Marabá, Fernando Monteiro indicou seu ponto de vista:
– “Agora, em relação a iniciativa privada, a falta de investimentos no setor pode ser explicado porque construir hospitais hoje não é um bom negócio. Porque, veja, a renda do hospital são as taxas da hotelaria, o restante dos valores que entram com uma internação hospitalar é dos médicos. Explicando mlehor: quando alguém vai fazer uma cirurgia, o valor do médico é do médico, o valor do anestesista é dele, e assim por diante. O que fica para o hospital são as taxas dos dias que paciente ficou internado, o tempo que ele vai permanecer na sala de cirurgia. Portanto, não é muito atrativo do ponto de vista de investimento – embora eu considere que em Marabá caberia muito bem uma maternidade de iniciativa privada. Agora, é preciso dizer da existência de uma carência muito grande de leitos num município polo como Marabá. E nem é preciso ir muito longe, Parauapebas tem muito mais leitos do que Marabá, tem mais hospitais do que Marabá. Se não falha a memória, acho que em Rondon do Pará existem três ou quatro hospitais. Voltando ao que eu disse no inicio, esse fenômeno em Marabá precisa ser estudado”, finalizou o médico marabaense.
Fotos de arquivo e enviada por usuária do hospital municipal