Lívia Rodrigues Mesquita (foto), a partir desta segunda-feira, 9, é a nova colaboradora do blog.

O tema de seu primeiro texto aborda as dificuldades enfrentadas por portadores de câncer, e a inexistência de qualquer tipo de política pública, em Marabá, voltada ao atendimento de vítimas da enfermidade.

Com passagens emocionantes traduzidas em revelações da luta que trava para vencer o câncer, Livia é um exemplo de juventude que sonha com vida longa e construtiva.

Seu primeiro artigo é uma ode à vida solidária, e à felicidade.

Talento e sensibilidade para fotografar as carências sociais da região, são valores facilmente identificados numa rápida conversa com Lívia -, e que estarão à disposição de nossos leitores, a partir de agora, para a elevação do debate

Dentro de dez dias, quando será publicado seu segundo artigo, a jovem advogada e uma das personagens mais atuantes pela campanha do Sim, durante o plebiscito, estará devidamente integrada à equipe de colunistas, na seção dedicada aos colaboradores, ao lado.

Boas vindas à nossa nova articulista.

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Por que Marabá não tem uma unidade oncológica?

– Lívia Rodrigues Mesquita (*)

 

 

“As palavras de amizade e conforto podem ser curtas e sucintas, mas o seu eco é infindável”Madre Teresa de Calcutá.

 

 

Estatisticamente, o Ministério da Saúde aponta que serão diagnosticados para este ano de 2012, cerca de 520 mil novos casos de câncer em todo o País. A projeção consta da Estimativa 2012 – Incidência de Câncer no Brasil, feita pelo Instituto Nacional de Câncer (INCA) e divulgada no início de dezembro.

Estamos falando, então, de meio milhão de pessoas, entre elas, uma minoria acolhida pela rede particular, e do outro lado, a grande massa padecente, numa espera árdua pelo Sistema Público de Saúde, problema que persiste sem solução.

É sabido que muitas cidades brasileiras, em especial aquelas com densidade demográfica acima de 200 mil habitantes, apresentam um cenário de evolução com políticas dedicadas à oferta e qualidade de atendimento personalizado a enfermos de câncer, estudos e conscientização voltados para prevenção, seguido de um tratamento completo, com o devido acompanhamento psicológico focado no bem-estar emocional do paciente , já que sem este é comum o surgimento de quadros depressivos. É comprovado que a depressão, um mal impetuoso e incapacitante, alcança 25% dos vitimados de câncer.

Marabá, perto de chegar aos seus 300 mil habitantes, apresenta uma Rede Pública de Saúde sem o mínimo de condições afáveis voltadas para esse tipo de moléstia, e, possivelmente, a Secretaria de Saúde de Marabá não possui sequer, números confiáveis de quantos novos casos da doença surgem a cada ano no Município. Sim, é fato a diversidade de indicadores, por isso a subdivisão de fontes de informação, entre eles, SISCAN/SISCOLO (Sistema de Informação do Câncer da Mulher) e INCA (Instituto nacional do Câncer). Ocorre que tais fontes confiam que os Municípios enviem dados, ou informatizados, ou através de planilhas de controle manual de informações. Fica a pergunta: Existem arquivos responsáveis pela coleta desses dados?

Perpassados mais de vinte anos do processo de institucionalização do Sistema Único de Saúde (SUS), ainda não se observam as implementações prometidas. Essa é a razão de nossa indignação que não pode ser estática, afinal, “saúde é direito de todos e dever do Estado”. Esse é mais um comprometimento, o qual, estamos todos envolvidos, e com ele, aceitamos os desafios, que não são poucos quando se trata de defesa da vida.

Peço desculpas por me despertar apenas quando o problema bateu em minha porta.

Hoje, minha peleja vai além de cobrar atendimento basilar aos nossos representantes, embora, nem com isso possamos contar. Temos uma vida para cuidar, temos famílias para compor, queremos o direito de construir uma história longa e um futuro com finais felizes. Portanto, temos pressa, e o mérito é nosso, de podermos confiar em uma assistência especializada de alta complexidade para o diagnóstico definitivo e tratamento de todo tipo de câncer (CACON). É esse futuro que os 225 mil habitantes da Cidade com status da mais importante da Região Meio Norte sonham. E, quando mencionamos “alta complexidade”, falamos em serviços de Cirurgia Oncológica, Oncologia Clínica, Radioterapia e Hematologia.

Por quase dois anos escrevo minha história nessa verdadeira batalha pela vida, e em meio a esses rabiscos, situações desesperadoras tentaram me desencorajar e me fazer desistir. A primeira delas foi saber que precisaria me tratar em outro domicílio. Viajo constantemente para Goiânia, onde abraço rigoroso controle da doença. Já nem consigo mais desfazer minha mala quando volto pra casa, já que dentro de 45 dias preciso retornar. Duelo um câncer de Tireoide, e como escudo, sou protegida por uma fé inabalável, e como armas, minha incansável esperança e o amor intenso de minha família salvaguardam minhas forças.

Por vários momentos desejei ter super poderes e me teletransportar para junto de meus familiares e amigos, quando na verdade, eu só podia contar com um quarto frio e pessoas estranhas ao meu redor. Foi quando descobri que não preciso de super poderes para ser uma heroína, afinal, suportar exames que nos levam a intensas reações físicas e emocionais é digno de verdadeiros heróis. Não há como questionar, tratamento em sua própria cidade e ao lado dos seus, brinda o paciente com um tratamento mais preciso e melhores resultados.

O tempo é relativo para um doente de câncer, ora lento, diante dos mais atribulados pensamentos e tormentosas dúvidas, ora rápido demais, quando nos referimos ao diagnóstico e antecipação à evolução do quadro, de modo que, é esta atenção precoce que permitirá maiores possibilidades para o paciente continuar a viver, sorrir, chorar, casar, conceber filhos, trabalhar…Quando é diagnosticado no interior, até que seja encaminhado a algum centro oncológico de outro Município, já terão se passado talvez meses, como efeito de um processo burocrático extenso e, provavelmente corruptível. Ocorre que, aqui, tempo é surreal, tempo é justamente o que um paciente de câncer não dispõe.

Não podemos ignorar que quanto mais tempo se leva tanto para se descobrir qualquer tipo de câncer, como também para iniciar seu tratamento, mais agressiva vai ser sua terapia, tendo em vista, as chances de cura estarem inversamente proporcionais ao tempo da descoberta do câncer.

Sou apenas mais uma no meio dessa multidão que sonha com o tratamento certo e de poder alcançar a cura. Logo, o sentimento humano e solidário passa a fazer parte do nosso tratamento. Trocamos experiências e conselhos, choramos, ouvimos uns aos outros, e naturalmente, a compaixão e a atenção voltada para muitos que também sofrem dessa doença vira um hábito bendito, mostrando que, o problema de cada um não é um fato isolado. Olhando por esse prisma coletivo, considero injustificável Marabá não ter pelo menos um Centro voltado para tratamento de câncer.

Já ouviram falar em TFD ou Tratamento Fora do Domicílio?

É uma ferramenta legal, a qual assegura através do SUS, tratamento médico ao paciente portador de doença não tratável no Município de origem por falta de condições técnicas. Assim, deve ser amparado, para esse paciente, bem como seu acompanhante, todo seu tratamento, incluindo também passagens de ida e volta e ajuda de custo para alimentação e hospedagem enquanto durar o tratamento, que poderá ser realizado até mesmo em outro Estado.

Marabá é habilitada em Gestão Plena do Sistema Municipal (GPSM), ou seja, a obrigação de arcar com essa despesa intraestadual é do próprio Município. Em se tratando de despesas interestaduais, a obrigação é atribuída à Secretaria de Estado da Saúde.

Acontece que, “cada um por si, e o poder público por ninguém” passou a ser ditado trivial em nossa região. Afinal, além de omitirem orientações à sociedade quanto a esse direito decisivo, ainda temos que suportar as burocracias abusivas e processos prolixos à espera de um deferimento para o TFD, tempo suficiente para alterações previsíveis e negativas do quadro clínico, ou melhor, evolução do câncer.

Nos tempos de hoje, diagnóstico de câncer não é mais atestado de morte, muito menos carência de vitalidade. Sentimento de auto piedade só afasta para mais distante o dia da cura. Não podemos nos curvar diante das adversidades, mesmo que muitos relutem em ajudar. Não podemos engavetar a esperança, nem abalar nossa fé.

No Distrito Federal, uma terceira Unidade Oncológica no Hospital Regional de Taguatinga, com três máquinas de radioterapia, já tem seu dia previsto para início das obras. O investimento total da terceira unidade custará em média, R$ 8,4 milhões, recurso provindo provavelmente do Ministério da Saúde. Então, porque tamanho descaso em nossa região?

E o que fazemos com nosso Art. 5°, caput, da Constituição Federal do Brasil, onde diz claramente que todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza?  Minha opinião ainda é acreditar, confiar e dar o meu melhor para que essa igualdade saia definitivamente do papel.

Para uma cidade do porte de Marabá, é lamentoso admitir a falta de compromisso por parte de nossos representantes. Nossa vida e saúde têm valores diferentes?

Um pouco de boa vontade associado com responsabilidade salvariam muitas vidas.

 

(*)- Lívia Rodrigues Mesquita, é advogada.