Texto abaixo foi extraído do Facebook da jornalista Simone Romero, de Belém.

 

Belíssimo!

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Tenho sérios problemas com a palavra “superação”. Não gosto. E não gosto porque, quase sempre, “superação” é usada para naturalizar a profunda injustiça social do Brasil. Para tornar palatável o abismo que existe entre as classes no País.

Meu filho mais velho, o Fernando, é surdo profundo e hoje cursa uma faculdade. Ele não é exemplo de superação de nada. Se ele conseguiu chegar a uma faculdade foi graças ao fato de eu ter condições de pagar para que ele tivesse acesso a tratamento adequado, a boas escolas, a aparelhos auditivos que chegam a custar quase o preço de um carro popular.

O carro popular, aliás, que eu nunca pude comprar porque investi o dinheiro no meu filho, parcelando em milhares de vezes a aquisição de uma prótese que é o sonho de vida de milhões de crianças surdas neste País. Eu pude e posso fazer isso sem nenhum drama. Mas há uma multidão de crianças que jamais vai ter acesso a uma prótese porque as políticas públicas são ineficientes. O dinheiro que poderia estar sendo investido para aquisição de aparelhos auditivos para crianças carentes some pelo ralo da corrupção.

Uma corrupção assassina que torna ainda mais perversa a divisão de classes nesse país, porque mata o sonho de uma vida melhor para milhões de brasileiros. E ainda há quem tenha a ignorância de criticar o pouco recurso que é destinado à redução das desigualdades, por meio de programas sociais e de políticas públicas de universalização de direitos básicos.

Em um país justo, todas as crianças com deficiência ou pobres ou pretas teriam condições de chegar onde quisessem porque teriam assegurados pelo poder público o acesso à educação, alimentação de qualidade, lazer, saúde, uma infância protegida e tantos outros direitos que são sonegados à maioria dos brasileiros.

O que pessoas como a Rafaela e tantos outros heróis anônimos do cotidiano são é sobreviventes. Sobreviventes de um Brasil onde a regra é a exclusão. Sobreviventes de um País socialmente eugênico. Quantos grandes atletas olímpicos não foram mortos nas periferias das grandes cidades? Quantos cientistas geniais o Brasil perdeu por falta de acesso a uma boa escola?

O maior exemplo que a Rafaela dá não é o de superação. Rafaela é um exemplo de que milhares de outras pessoas nascidas nas mesmas condições que ela poderiam, neste momento, estar enchendo o Brasil de orgulho, se o Brasil tivesse uma melhor distribuição de renda e mais programas sociais.