Na semana que passou, a Unifesspa (Universidade Federal do Sul/Sudeste do Pará) se deparou com os resultados de um ranking universitário onde a instituição aparece como a quarta pior universidade do país.

O já considerado controverso Ranking Universitário Folha (RUF), do jornal Folha de São Paulo,  soou como uma aberração, dado a discrepância de seus critérios usados como parâmetros de avaliação.

A  discrepância dos indicadores do RUF prova, definitivamente, que alguns rankings universitários precisam ser relativizados.

São os desenvolvedores dos rankings que, ao elaborarem suas classificações, definem o que é uma universidade “de qualidade” e informam à sociedade quem vai bem e quem vai mal.

Tais critérios são muito contestáveis na academia.

A maioria dos rankings universitários considera, por exemplo, a quantidade de citações recebidas pelos trabalhos publicados pelos pesquisadores das universidades –o chamado “fator de impacto”.

O problema é que escolas fortes em áreas que são pouco citadas, como humanas, perdem pontos nessa avaliação, o que não significa que sejam ruins.

Mais: fatores como impacto social da universidade não são medidos nessas listagens.

Especialistas em educação estão contestando o método adotado no Ranking Universitário Folha (RUF) para avaliar as instituições de ensino.

Itens como a utilização da nota do Enade no cálculo das notas das universidades e o modo como os indicadores “qualidade de ensino” e “mercado” são produzidos foram citados como imprecisos.

Só para mostrar uma forte discrepância, desde  sua segunda edição, em 2013, o RUF conta a nota das universidades no Enade em um dos componentes do indicador que avalia qualidade de ensino, que vale quatro pontos. A USP zera nesse indicador, pois seus alunos não realizam a avaliação.

É importante ter em mente que os rankings não são instrumentos neutros, mas sim construídos e utilizados intencionalmente, para fins e contextos específicos.

Hoje, diante do cenário político conservador propício ao discurso privatista, o RUF está sendo apontado como ponta-de-lança de uma campanha contra as universidades gratuitas.

Os próprios acionistas do Grupo Folhas seriam os primeiros interessados em investir pesado na universidade privada.

O blogueiro analisou cuidadosamente o desequilíbrio de indicadores que levaram nossa Unifesspa a ser considerada uma das “piores” universidades do país.

PESQUISA

No item “Pesquisa”, que equivale a 42% na pontuação geral do ranking (mais alto peso), quando você vai identificar de onde foram as bases da pesquisa, todos os indicadores são dos anos 2013 e 2014.

Ora, qualquer Universidade nova, criada a partir de quatro anos pra cá, não caberia nessa avaliação.

A Unifesspa, por exemplo, que não tem quatro anos ainda de criação, mesmo os professores que já atuavam em seus campis –  as publicações deles (para servir de avaliação no item pesquisa)  estão em nome da UFPA, naqueles anos.

Um artigo pra ser publicado, na média, leva um ano.

Portanto, é impossível que isso reflita qualquer realidade.

Ou seja, os docentes da Unifesspa não têm ainda um tempo de maturação para começarem a publicar.

O tempo ainda está bastante exíguo.

Analisando artigos de 2015 a 2017, nenhum deles entrou na avaliação da pesquisa.

E os que entraram, de professores hoje da Unifesspa, os artigos estão em nome da UFPA.

 

ENSINO

Outra categoria na avaliação do RUF, é a de “Ensino”,  com peso 32%.

Pois bem, nesse item, a Unifesspa  tem  32 cursos e a Folha de São Paulo avaliou apenas 17 cursos da instituição

Mais: dos  17 cursos apontados como avaliados, cinco verdadeiramente NÃO  foram avaliados até hoje.

E dos  12 que verdadeiramente receberam avaliação, quatro  têm nota 4.

Os cursos que obtiveram nota 4 (numa escala que vai de zero a cinco) são Administração, Biologia, História e Letras.

Ou seja, quase nota máxima.

Professores com Doutorado e Mestrado, o RUF pega o Censo de 2015, quando já estamos em 2017 – uma informação que eles usaram totalmente defasada!

Outra informação importante desconsiderada no ranking: nos últimos dois anos, a Unifesspa contratou centenas de professores, mas exatamente 150 professores não foram incluídos na avaliação.

Para medir o desempenho das universidades no quesito ENSINO, a Folha usou as notas do Enade de 2013.

  (Enade –  Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) é, ao lado da análise dos cursos e das instituições, um dos meios de avaliação da qualidade da educação superior no Brasil.)

 

E aí a Unifesspa, de novo, foi prejudicada, já que dos cursos que o ranking avaliou, nove são novos e, por isso, nenhum deles teve avaliação do Enade, já que a universidade estava sendo implantada.

Os avaliadores do RUF pegaram número de teses do ano de 2015- quando os professores atuais nem faziam parte ainda do quadro.

MERCADO

Outra cipoada: no item “Mercado” , que representa 18% da pesquisa do ranking da Folha de São Paulo, a nota da Unifesspa é simplesmente  nula.

Um absurdo, facilmente explicável.

A Unifesspa tem pouco mais de cinco mil alunos nos bancos. Destes, cerca de 1.300 alunos foram diplomados.

O Datafolha pesquisou no Brasil inteiro 5.793 profissionais de RH, indagando sobre preferências de contratação, e certamente estes profissionais consultados não ouviram falar  de contratações de gente oriunda da Unfesspa.

Claro! Cerca de 1.300 diplomados é um número irrisório no universo nacional para que profissionais de RH possam se reportar da existência da Unifesspa.

A maioria dos cursos foi criada recentemente e não formou nenhuma turma ainda.

Daqui a mais alguns anos, quando a Unifesspa estiver formando cerca de 5 mil alunos, aí tudo muda de cenário.

É um número potencializado para pesquisas do tipo discutido.

Portanto, uma leitura mais atenta ao resultado desse esquisito ranking da Folha de São Paulo nos leva a considera-lo perfeitamente fora de contexto, encobertado por índices de arbitrariedade que não retratam a realidade de algumas instituições

E é sempre bom lembrar que o MEC só considera qualquer universidade implantada quando ela completa 10 anos desde sua criação.

Um índice desse de avaliação da Folha de São Paulo deveria ter critérios claros, como por exemplo, começar a contar publicação a partir de um certo tempo de criação da instituição.

Do jeito que a FSP procede é como você querer saber quantos gols uma criança de um ano de idade já fez.

É impossível.

Outra crítica que está sendo feita pelos educadores aponta para a desvantagem de se colocar instituições com características tão distintas em um mesmo pacote e daí tirar um número final para classificá-las.

Algumas informações são, de fato, úteis.

Poder, a partir de um critério específico, comparar-se em relação às outras é relevante e dá uma dimensão de nossa posição no mundo, mas comparar universidades seria uma tarefa capciosa.

Existem vários desafios na construção de uma Universidade.

A diversidade das instituições, em termos de tamanho, recursos financeiros e contexto sociocultural, é uma delas.

E a própria obtenção dos dados também.

A ausência de fontes de informação que permitam coletar adequadamente dados sobre as atividades das universidades faz com que essas intuições sejam classificadas com base em indicadores de atividades que podem ser medidas, não com base nos indicadores de que atividades desejam medir.

Independentemente de avaliação baseada em publicações, ou  avaliada em qualquer critério – o que temos de ter em conta é o papel da Unifesspa para a região, qual seja: melhorar a qualidade do ensino regional, e melhorar o conjunto da realidade regional.

 

Essa posição é defendida pelo Reitor Maurílio Monteiro (foto):  “- A Unifesspa deve ter como meta, melhorar os ensinos Básico e Médio, que são  um desastre na região Sul/Sudeste do Pará. Isso é um problema da universidade!”

Maurílio também defende a Unifesspa interagindo com o seu entorno, melhorando  a qualificação dos recursos naturais regionais, já que eles produzem danos ao meio ambiente,  e produzem pouca riqueza.

A produção de riqueza, em nossa região, não deve ser voltada à negação da diversidade social, cultura,  étnica, biológica –  e usada de forma pouco qualificada. Por isso, temos como tarefa também permitir  que a Unifesspa crie e impulsione um novo processo e organização, tratando de ajudar a mudar diversidade como ela é tratada”, diz.

E um terceiro foco: atuar mais diretamente para ajudar a melhorar a saúde das populações regionais.

–  “Daqui a dez,  vinte anos, queremos que a nossa universidade seja avaliada em três indicadores: como interferimos na qualidade do Ensino Básico e Ensino Médio; como interferimos  concretamente na dinâmica social , que hoje é marcada pela utilização muito pouco qualificada da  diversidade.  E, como instituição, interferir diretamente na Saúde. Isso eu acho que seriam indicadores importantes  para a nossa Unifesspa ser avaliada. Queremos ser reconhecidos como instituição que ajudou a mudar e transformar vidas de milhares de pessoas que residem nesta região“.