De repente a nação amanheceu inteligente. De norte a sul, mentes apagadas puderam brilhar, inteligências borradas se coloriram como arco-íris de caderno escolar, cabeças vazias se encheram com os ventos da presunção, desinformados em geral saíram do armário da ignorância e pela primeira vez se viram de posse da suprema oportunidade de caçoar da desinteligência de alguém, momento único na vida de muitos.

Essa demonstração coletiva de inteligência se deveu à afirmação da presidente Dilma Rousseff sobre o desafio de estocar vento.

Dilma poderia ter sido mais técnica. Poderia falar em técnicas de armazenamento da energia eólica. Mas corria-se o risco de metade dos críticos achar que estava mencionando a energia que sai do corpo feminino durante as cólicas menstruais.

Talvez melhorasse se falasse em técnica de armazenar energia produzida pela ação dos ventos. Mas aí os gênios do cartesianismo-ao-alcance-de-todos bradariam do fundo da récova: vento não produz energia, quem produz energia é a máquina. E haveria uma nova discussão sobre o tema, com todos irmanados no mesmo nível de informação e de raciocínio.

Hoje em dia uma das grandes vocações brasileiras é no campo da energia limpa. E, dentro dela, a energia eólica – energia o que? perguntariam os que se regozijaram com demonstrações de inteligência crítica caçoando da estocagem de vento.

O grande desafio da energia eólica é que tem que ser consumida no momento em que é produzida. Ao contrário da energia hidrelétrica, que fica acumulada nos reservatórios com a água estocada ou das termoelétricas cujo combustível é o óleo ou o gás.

Enquanto não se encontrar um meio de estocar a energia eólica (e-ó-l-i-c-a, gênios do senso comum), o seu crescimento estará condicionado à quantidade de energia hidráulica armazenada na forma de água dos reservatórios e interligados por um sistema nacional integrado.

É chata essa discussão? É. Imagine explicar aos gênios do senso comum o trabalho, em um sistema interligado, de casar a produção de energias não contínuas, como a do vento, com as energias estocáveis das hidrelétricas.

Afim de poupar o senso comum de conceitos acessíveis apenas aos iniciados, a língua portuguesa se permite figuras de linguagem. Dizer que os reservatórios estocam energia é uma metáfora que explica bem o conceito, sem precisar explicar aos explicadinhos todo o processo de transformação da água em energia. O mesmo ocorre com a estocagem de vento.

Mas o país que consagrou piadas sobre a férrea lógica dos irmãos portugueses, herdou de Portugal tipos inesquecíveis, imortalizados por quem, mais do que qualquer um, entendia a alma de personagens típicos da vida nacional, os autênticos cabeças de vento: Walter Dávila. ( Odonir Oliveira, especializado em Energia Eólica)