Ser assim é uma delícia
Desse jeito como eu sou
De outro jeito dá preguiça
Sou assim pronto e acabou.
(…)
Brincadeira, choradeira,
Pra quem vive uma vida inteira
Mentirinha, falsidade,
Pra quem vive só pela metade.

Quando alguém me desaponta
Paro tudo e dou um tempo
Dali a pouco eu me dou conta
Que ninguém é cem por cento

Seja um príncipe ou um sapo
Seja um bicho ou uma pessoa
Até mesmo um pé-de-nabo
Tem alguma coisa boa.
(Música: Pé de Nabo – Palavra Cantada)

 

A letra da música Pé de Nabo é um viva à diversidade. O grupo musical Palavra Cantada desenvolve um trabalho lúdico voltado para a infância. Suas letras são alegres, gostosas de cantar e ouvir, sempre trazem alguma reflexão sobre a alegria de viver. O ritmo da música é envolvente, nos leva a um mundo cheio de sons, batuques, trejeitos, molejos, mexidas pra lá de deliciosas. Música boa, bonita, envolvente, capaz de transformar pensamentos, ações. E quando essas ações são pensadas para as crianças, elas devem ser permeadas por metáforas, rica de imagens e sons, enfim, de qualidade.

A letra da música também nos leva a refletir sobre as diferenças, a diversidade que encontramos em nosso mundo. Somos diferentes e como nos diz Tatiana Belinky

(…) Cada um na sua
E não faz mal
Di-ver-si-da-de
É que é legal

Vamos, venhamos
Isto é um fato:
Tudo igualzinho

Ai, como é chato!

Em seu poema Diversidade, Tatiana mostra a chatice que seria se todos fossem iguais.
A valorização do outro como diferente, tem sido um tema recorrente nas escolas, quer pública, quer privada. Nossas crianças, desde a Educação Infantil (3 a 5 anos), já são envolvidas em discussões interessantes sobre a questão das diferenças, da valorização do outro enquanto sujeito singular e plural.

Respeitar a diversidade é extrapolar o mundo das ideias, dos conceitos, das verdades e, assim, poder resgatar o mais humano dos humanos. Para tanto, é fundamental a vivência de atitudes acolhedoras, na prática, no cotidiano.

A prática da diversidade começa com mudanças de atitudes, em cada um de nós, e, principalmente, do poder público.
Pessoas com deficiências sofrem por não viverem em uma sociedade consciente dessa diversidade, começando pelos acessos inexistentes para essas pessoas, nas ruas, nas praças, nos órgãos públicos, nas empresas privadas, no condomínio, na escola etc.

Acessibilidade é um direito de todos: do cadeirante, do cego, do surdo, do idoso, e de todos aqueles que, por alguma razão, locomovem-se com dificuldades.

Posso citar um exemplo que vivenciei há poucos dias com minha tia. Ela usa uma bota especial, e, por ordem médica, precisa fazer caminhadas. Atividade física super normal, porém, para quem utiliza um calçado diferente é uma tortura caminhar pelas ruas de nossa cidade. Estava indo fazer minha caminhada logo cedo e a encontrei na calçada de nosso bairro. Primeiro brinquei: e aí tia, que velocidade!!!. Depois me revoltei. Nunca havia me atentado para o estado de nossos passeios públicos, esburacados, mal nivelados, sem rampas de acessos.

Enfrentei com ela a meia hora de caminhada. Lentamente passeamos, conversando sobre a família e tentando fazer aquele momento menos sofrido para ela.

Passei a olhar para os lugares que frequento com mais atenção, verificando se a “LEI FEDERAL 10.098/2000” que prima pela acessibilidade está sendo cumprida. Em alguns setores observei o cumprimento da lei parcialmente; em outros, reina uma completa ignorância, e ou descaso sobre o assunto.

A acessibilidade não é somente construir rampas e fixar corrimãos. Acessibilidade é proporcionar, a qualquer cidadão brasileiro, paraense, marabaense etc, o direito de ir e vir com dignidade, sem passar por dificuldades e constrangimentos diariamente.

Um cego necessita tocar, pegar, sentir, para se localizar. Onde estão nossos avisos em braile? Um surdo precisa visualizar para se mover, onde estão as sinalizações nos prédios, nas escolas, nas ruas? Um cadeirante ou quem tenha outra deficiência que dificulte a locomoção procura por terrenos planos, bem nivelados e seguros para ter autonomia de movimento. Onde está acessibilidade?

Educadores, de forma geral, cumprem seu papel de conscientizar os alunos para o respeito à diversidade. Projetos, sequências didáticas, diálogos em rodas de leitura sobre o assunto, são frequentes nas escolas.

No entanto, nossos alunos não vivenciam o que aprendem. Nossa sociedade nega, omite, ignora o tema. Como diz a letra da música “Pé-de-nabo:” Mentirinha, falsidade, pra quem vive só pela metade.” Preferem viver pela metade, fingindo que a diversidade de pessoas não existe, vivendo de forma obscura.

 

“Brincadeira, choradeira, pra quem vive uma vida inteira.”

 

Viver de verdade, por inteiro, é permitir-se chorar, rir, frustrar-se, sentir raiva, enfim aceitar as várias nuances da vida que se apresentarem. Respeitar pessoas com deficiências, além de estarmos cumprindo a lei, é estar dizendo a elas:

“Ser assim é uma delícia…”

 

(*) Evilangela Lima, Educadora, Diretora da Escola de Ensino Fundamental São  José.

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P.S.: Dedico este texto a minha turma de Especialização em Educação Infantil da UFPA (a turma mais festeira do campus). Nesse modulo brincamos, deitamos no tapete nas rodas de leitura, dançamos de montão, cantamos feitos loucos. Aprendemos a vivenciar a diversidade com alegria, respeito e consciência.

Galera, conseguimos!!! Somos especialistas! Daqui a pouco seremos mestres e doutores…

Agradeço a professora Wanderléia Leitão, doutora especialista em Educação Inclusiva, por ter me auxiliado na elaboração desse artigo.

Beijão professora!!!