A Bacharel em Direito Lívia Rodrigues Mesquita, em seu segundo artigo escrito especialmente para o blog, apresenta números preocupantes sobre o aumento da morte no trânsito, especialmente em Marabá, expondo dados estatísticos oficiais.

“Relevante lembrar que, segundo consta de dados de Seguradoras, existe uma proporção maior de acidentes envolvendo condutores do sexo masculino, e, na maioria das vezes, habilitados há mais de cinco anos, reunindo ao mesmo tempo, a combinação desastrosa do antigo conceito machista com o excesso de segurança”, diz a colaboradora, em suas observações cuidadosas.

A seguir, o artigo de Lívia:

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A morte pede passagem no trânsito louco das cidades – Parte 1

 

(*) – Lívia Rodrigues Mesquita

 

 

“…Quem é essa mulher
Que canta sempre esse lamento?
Só queria lembrar o tormento
Que fez o meu filho suspirar
Quem é essa mulher
Que canta sempre o mesmo arranjo?
Só queria agasalhar meu anjo
E deixar seu corpo descansar
Quem é essa mulher
Que canta como dobra um sino?
Queria cantar por meu menino
Que ele já não pode mais cantar…” (Angélica – Chico Buarque).

 

 

Lamentável fato, porém fidedigno, obriga-nos a admitir que 90% dos acidentes no trânsito são sequelas de falha humana, seja por descomedimento de velocidade, seja por dirigir alcoolizado ou sob efeito de drogas, ou até mesmo por inobediência aos limites de idade ao volante.

Já que “acidente” tem por natureza ser “evitável”, por que nossas estatísticas mostram que, em dez anos, o índice de acidentes fatais vitimando jovens cresceu mais de 30%? Acontece que, muitos desses jovens ceifam até mesmo suas próprias vidas segundos depois de adentrarem naquilo que para eles resumem expressão de fortaleza, acerbando uma atitude egocêntrica, (des)governando seus carros sem o mínimo de ideal humanitário, pois, aqui, a vida perde seu valor, e, números inexatos de famílias mudam para sempre suas histórias. Mais decepcionante ainda, é saber que muitos desses casos ficam a mercê de uma fiscalização viciosa e apadrinhada, e, a vida, nas mãos de muitos agentes corruptos, outra vez, perde seu valor.

Relevante lembrar que, segundo consta de dados de Seguradoras, existe uma proporção maior de acidentes envolvendo condutores do sexo masculino, e, na maioria das vezes, habilitados há mais de cinco anos, reunindo ao mesmo tempo, a combinação desastrosa do antigo conceito machista com o excesso de segurança.

Apesar de certas implementações, ainda somos amparados por uma legislação falha, com lacunas, as quais, por se tratar de uma redação totalmente arcaica, consentem que muitos saiam impunidos.

Em outubro deste ano, São Paulo enfrentou o luto por noticiar a morte de Edson Roberto Domingues, que não resistiu queimadura de 90% do seu corpo, provocada por um Camaro desgovernado e conduzido por um filho de vereador, Felipe de Lorena Infante Arezon, o qual apresentava indícios notórios de embriaguez. Além de vitimar fatalmente Edson, no mesmo acidente, Felipe colidiu com vários carros, atropelou pessoas, deixando-as gravemente feridas, e ainda, fugiu do local. O luto se estendeu quando esse assassino pagou fiança de aproximadamente R$ 245 mil e pôde sair em liberdade.

Os números desapontadores não param por ai.

Estamos entre os recordistas de mortes no trânsito, portanto, carecemos com urgência de políticas voltadas para instrução. Não me refiro tão somente às propagandas educacionais que passam três vezes por dia na TV, falo de propostas de conscientização habitual, e, então, nesse momento, caminharemos para um novo retrato da realidade de nossas estradas.

A chamada “Lei Seca”, cujo mérito objetiva reduzir acidentes causados por motoristas inebriados, isoladamente, não mudará o triste conceito que assombra o coração de uma mãe toda vez que vê seu filho saindo de casa. É imperativo que tenhamos uma fiscalização diligente. Também, necessário é prevenir, educar, orientar, dialogar, e não só pensar num processo de arrecadação através de um somatório de multas.

Esse processo de educação deve ser precoce e vivo em nossos lares e escolas.

Nos “pegas” (racha) é inegável a confusão de comportamentos previsíveis dos jovens, ou seja, mesmo que não tivessem acesso ao carro, possivelmente, outros meios providenciariam para tornar a vida banal, seja deles ou de outras pessoas (uma verdadeira roleta russa). A excitação da transgressão cumulada com sentimento de potência trata a vida com mediocridade. Assim, existe um entendimento que, parte da personalidade de um condutor é de responsabilidade do núcleo família, ou seja, dos valores iniciais, onde importâncias comportamentais são ensinadas.

É aqui onde o Amor entra: o amor à vida e ao próximo.

É aqui onde os limites baseados nos bons costumes e no ordenamento jurídico se confirmam, mediante o próprio exemplo espelhado dentro do lar.

Como permitir silenciosamente que, a cada ano, aproximadamente 200 mil pessoas sejam internadas por motivo de acidente no trânsito brasileiro? Esses números suplantam nossa dor quando conhecemos que 40 mil vítimas morrem nessa mesma estatística de um ano.
Necessário informar também que existe um impacto econômico muito grande, o qual grande parte dele recai sobre a renda das famílias brasileiras, não bastando que essas convivam com a dor de terem lhes tirado imprudentemente ou negligentemente um ente querido. Como resultado desses dados flagelantes, também recorrentes em outros Países, a ONU recomendou para cada País, planejamentos de ações e execução das mesmas e que estabeleçam metas de redução de vítimas.

Como bom início, podemos e devemos exigir maior cautela quanto à política nacional de redução de morbimortalidade por acidentes e violências. Também, praxes que estão ao alcance de todos, voltadas para segurança no trânsito, merecem prioridade, a começar pela orientação dentro dos nossos lares, devendo ser repassados como exemplo aos nossos filhos, tais como, não avançar semáforos fechados, revisar os aprestos determinados para trafegar com o veículo, bem como não permitir que o mesmo se transforme em um instrumento de morte para externar o estresse do dia a dia.

Reflita! A imagem que um condutor impetuoso passa é de alguém que sequer se importa com sua própria vida, logo, o que dirá com a vida dos outros!

Também, o hábito que o motorista tem de se entreter com outras situações enquanto dirige é responsável por uma preocupante parcela desses números fatais: apagar ou acender um cigarro, falar ao celular, entre outros, disputam o topo quando falamos em falha humana.

Imprudências e negligências são, muitas vezes, acompanhadas por ações de violência. Desentendimentos entre motoqueiros, condutores de automóveis e até mesmo pedestres, desencadeiam verdadeira consagração de selvageria, acarretando por vezes, responsabilidade criminal.
Existem habitualidades infelizes, entre elas, ação de motoqueiros tirando proveito de espaços encurtados, protagonizando 60% dos acidentes no trânsito; condutores de carro trafegando apressadamente e impacientemente; e, pedestres que, por desatenção, ou afoitamento, subestimam o fato de preencherem a parte mais frágil desse panorama, ignorando faixas de travessia. E assim, entre eles, o tempo se fecha, onde se tornam agressivos uns com outros.

 

(*)- Lívia Rodrigues Mesquita é Bacharel em Direito.
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Nota da autora: Este artigo, escrito em duas partes, terá prosseguimento na próxima semana.