Dois anos e meio depois de dar início a acordos que levaram à regularização de mais de 40 mil propriedades rurais de criação de gado no Pará, o Ministério Público Federal (MPF) agora concentra esforços para incentivar a sustentabilidade na cadeia produtiva do ferro-gusa, uma das matérias-primas do aço e um dos produtos da pauta de exportação brasileira.

Entre as medidas propostas pelo MPF estão a assinatura de um pacto entre a instituição, setor empresarial, governo e órgãos de controle ambiental para impedir a atuação de fornecedores ilegais de carvão vegetal, utilizado para a fabricação do ferro-gusa.

Desde o final da década de 80, quando as primeiras indústrias siderúrgicas se instalaram na região leste da Amazônia, no chamado polo Carajás, pesquisas apontam o alto índice de produtores de carvão que atuam na clandestinidade e abastecem as guseiras, o que provoca desmatamento ilegal e trabalho escravo, entre outras irregularidades.

Em 29 de novembro deste ano, após a deflagração da operação Saldo Negro, do Ibama, os procuradores da República Tiago Modesto e Daniel Azeredo se reuniram em Belém com o setor, o Ibama e a Sema para a apresentação da proposta preliminar do Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta (TAC). Em seguida, as siderúrgicas tiveram um prazo para se manifestarem sobre os termos do acordo. As propostas foram analisadas pelo MPF e serão levadas em conta quando da formalização do pacto, o que deverá ocorrer até dia 20 de janeiro, após nova reunião com o setor no início do ano que vem.

Compromissos das siderúrgicas – Os TACs irão estabelecer, entre outras obrigações e compromissos, que as siderúrgicas devem instalar e manter banco de dados atualizados e disponíveis aos órgãos ambientais com informações sobre a origem do carvão produzido nas carvoarias fornecedoras, com detalhes sobre as fontes de suprimento desses locais. Além de informações sobre seus fornecedores, as siderúrgicas terão que publicar todos os dados sobre a produção anual de ferro-gusa e se comprometerão a indicar permanentemente quais são os compradores do produto final, bem como informar detalhadamente a situação de seus projetos de reflorestamento e de reposição florestal, que também serão auditados.

Pela proposta de acordos, as indústrias também terão que apresentar Plano de Suprimento Sustentável (PSS) e assumir o compromisso de até 2014 implementarem projetos de reflorestamento que garantam a cada uma delas a autossuficiência plena na produção de carvão. Enquanto a autonomia sustentável na geração da matéria-prima não for atingida, as empresas devem se comprometer a comprovar, antecipadamente, a aquisição de carvão produzido a partir de fontes lícitas e origem legal.

Além disso, seus fornecedores não podem estar na lista suja do trabalho escravo nem na lista de áreas embargadas pelo Ibama, entre diversos outros pré-requisitos relacionados à certificação da cadeia de custódia da origem do carvão.

Em razão do histórico de utilização de carvão de origem ilegal, as siderúrgicas terão que recompor o passivo ambiental e devem então custear a realização de auditorias externas em caráter continuado, além de recuperar área equivalente em medida de extensão a 95% do dano ambiental apurado pelo Ibama ou adotar medidas de compensação ambiental proporcionais ao passivo levantado. Os restantes 5% do dano deverão serem revertidos por meio de pagamentos, via Fundo Estadual do Meio Ambiente, a projetos de preservação ambiental e ao financiamento de programas de inclusão social de trabalhadores resgatados em carvoarias pelas equipes do Ministério do Trabalho e Emprego.

Outra opção às empresas para compensação dos prejuízos ao meio ambiente é a aquisição e doação ao Estado do Pará ou à União de área equivalente à degradada, preferencialmente aquelas pendentes de regularização ocupacional fundiária.

Compromissos do governo e MPF – Pela proposta de acordo, a Sema, entre outros compromissos, terá prazo para implementar um programa intensivo de monitoramento ambiental, fazendo um pente fino para verificar a legalidade das licenças ambientais já emitidas para carvoarias e siderúrgicas, no que poderá contar com o auxílio de auditorias externas custeadas pelas siderúrgicas. Só assim deverão ser validadas as licenças existentes e só serão emitidas novas licenças para as empresas que comprovarem a origem lícita dos insumos.

A Sema também deve comprometer-se a fiscalizar anualmente o cumprimento das exigências que devem ser previstas nas licenças de operação dos empreendimentos (essas exigências são conhecidas como condicionantes ambientais), e a estabelecer uma parceria mais próxima com os municípios onde estão instaladas as indústrias ou tenham atribuição de licenciar fornos para a produção de carvão, que também deverão ser controlados e fiscalizados pela Sema.
MPF ressalta que a Sema não poderá mais atestar a regularidade de fornecedores antes da comprovação da legalidade das carvoarias e da origem lícita da matéria prima utilizada na produção do carvão consumido pelas siderúrgicas.

Outro ponto constante no pacto é o aprimoramento dos sistemas e da capacidade da Sema de monitorar as fontes de suprimento de matéria-prima florestal e controlar a produção e o transporte do carvão, de modo a poder barrar em tempo real qualquer tentativa de fraude. Deverá ainda ser criado um sistema eletrônico de rastreabilidade da cadeia produtiva, com todas as ferramentas necessárias para permitir o acompanhamento do produto desde a origem até seu destino final.

O Ibama vai ficar com a responsabilidade de realizar auditorias anuais sobre a validade dos dados registrados nos sistemas de controle da cadeia produtiva. Todos os compromissos assumidos pelo setor empresarial e pelo governo serão acompanhados pelo MPF, que tem a obrigação de cobrar o cumprimento do acordo, juntamente com o Ibama.