Em sua lendária Harley-Davidson, o desembargador do Trabalho, José Alencar segue firme na viagem rumo ao Alaska, atravessando, neste momento, a Venezuela, depois de navegar por cinco dias pelos rios da Amazônia, saindo de Belém.

José Alencar, aos 61 anos, aventura-se numa fantástica expedição, por enquanto, praticamente solitária, explorando rios, rodovias sinuosas, canais, e, brevemente, a imensidão das autoestradas norte-americanas, antes de chegar ao Alaska.

A viagem de moto de Alencar deve estar sendo uma constante descoberta.

Novas descobertas.

E como não há descoberta sem descobridores e descobertos, o que há de mais intrigante na viagem do corajoso desembargador é a sua busca pelo distante.

É o tipo de situação, sobre o dorso de uma Harley-Davidson, na qual o piloto tem a  descoberta como uma relação de poder e de saber.

Sem olhar para trás, Alencar segue destemido, de olho no GPS e obedecendo seguramente suas coordenadas, que são medidas pelo que há de mais moderno em tecnologia.

Só pra ter ideia do quanto a viagem está super planejada, o nosso “Marco Polo” é linkado às redes sociais através dos serviços da Spot Global, que indica pontos de ratreio do viajante, onde quer ele esteja, em tempo real.

Através do aplicativo, José Alencar tem sua trajetória compartilhada a cada, no máximo dez minutos, indicando coordenadas e outras  mensagens.

Veja abaixo.

 

Zé Alencar

 

Leiam a crônica que José de Alencar postou em seu Facebook quando cruzava o Furo de Breves, dentro do navio que o levou até Manaus.

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Os açaizais e buritizais sem fim, as várzeas habitadas pela nossa gente amazônica dão razão a Harald Sioli: Amazônia é terra, água, floresta e gente; buritizeiros e açaizeiros na beira do rio emoldurando palafitas provam essa assertiva.

As estradas alteraram isso pois via de regra se tornaram frentes de penetrações e de destruição da floresta antes mesmo dela ser desvendada, conhecida.

No convés intermediário do navio os punhos de redes cruzam vidas amazônicas, argentinas, venezuelanas e colombianas, uma pequena amostra de Nuestra América.

Tudo passa pelos Furos de Breves e a quantidade de embarcações surpreendeu.

A tradição de jogar sacos plásticos com roupas para crianças e mães em barquinhos (alguns com rabeta) continua.

Motociclistas e passageiros que querem fazer essa filantropia convém preparar em Belém os sacos com roupas de criança, como é o costume local.

As crianças felizes brincando no convés fazem dele um minúsculo play-ground flutuante. 
Chegada ao Porto de Breves às 9:00 h produz uma invasão de vendedores de quentinhas (quem comprou não gostou) e açaí.

A atracação é no bordo de outro barco e o cheiro de diesel queimado denuncia motores desregulados.

O galpão abandonado da Robco, na margem oposta, é testemunho de mais um ciclo de crise da exploração de madeira nativa, em vias de superação, a julgar pelo funcionamento de outras serrarias mais adiante. 

Um empréstimo de 2 reais entre desconhecidos para comprar pães massa fina: é a alma da nossa gente se apresentando diante de meus olhos e ouvidos.

Torres da linha de transmissão de energia elétrica atravessando o furo anunciam que a energia de Tucuruí enfim chegou a Ilha de Marajó trinta anos depois.

Converso com Hermenegildo, pescador de Santa Helena – MA, beneficiário do seguro-defeso (cerca de dois mil reais por mês, de janeiro a abril); e Elias, bragantino de Tracuateua – PA, agricultor em Mucajaí – RO (bananas e grãos/favas).

Eles dão notícias da política (Prefeito de Mucajaí é um médico cubano naturalizado que derrotou o candidato apoiado pelo Senador Romero Jucá; índios que sofrem com a saída dos arrozeiros da reserva indígena Raposa-Serra do Sol tem seus relatos apropriados pelos arrozeiros com o sinal trocado; o candidato do Sarney perdeu a eleição em Santa Elena – MA). 

Com a chuva das quatro da tarde as sanefas são baixadas e azulam o mar de redes.

Em um furo o navio reduz a velocidade e é abordado por uma lancha e assim seguem juntos para embarque de cabos de vassouras por transbordo. É, pelo menos, alguma transformação que agregou um pouco de valor à madeira nativa.

No convés de carga tem motocicleta, melões de Mossoró, tomates, cebolas, medicamentos, fertilizantes e cabos de vassoura. 
Uma minúscula e rústica cozinha comunitária, mais ou menos como as dos albergues (fogão a gás de uma boca) atende mochileiros e passageiros comuns, inclusive as mães que preparam as papinhas das crianças (há um recém-nascido a bordo).

Anoiteceu já em Gurupá e 22 h o navio atracou para receber/deixar passageiros e alguma carga acondicionada em caixas de isopor.

Hora de dormir. 

Boas noites.

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Que o sol esteja sempre brilhando na trajetória de nosso Juan Ginés de Sepúlveda e Bartolomé de Las Casas – do século XXI.

Alencar, na divisa do Amazonas com Roraima
Alencar, na divisa do Amazonas com Roraima